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25/06/2016 - 10:00

26 de junho: Dia Internacional de Apoio às vítimas da Tortura

Nessa data, em todo o mundo, são realizadas ações para alertar a sociedade sobre os efeitos da tortura, publicizar os mecanismos de suporte às vítimas e preservar a memória para que essas pessoas não abandonem a luta por justiça e reparação.

26 de junho: Dia Internacional de Apoio às vítimas da Tortura

Desde 1997 a Organização das Nações Unidas (ONU) instituiu o dia 26 de junho como o Dia Internacional de Apoio às Vítimas da Tortura. Nessa data, em todo o mundo, são realizadas ações para alertar a sociedade sobre os efeitos da tortura, publicizar os mecanismos de suporte às vítimas e preservar a memória para que essas pessoas não abandonem a luta por justiça e reparação.

A Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Conselho Federal de Psicologia (CFP) participa e apoia as atividades em alusão à data, organizadas por coletivos como o Coletivo RJ Memória, Verdade e Justiça, um espaço que congrega diversas entidades e pessoas com o objetivo de promover ações relacionadas aos direitos humanos. O CFP, que já integrava o Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (CNPCT) da Secretaria Especial de Direitos Humanos do Ministério da Justiça e Cidadania, no último biênio, foi habilitado mais uma vez como candidato à vaga de representação desse comitê no biênio 2016-2018. Os representantes selecionados serão conhecidos no dia 8 de julho e o CFP foi aprovado na categoria Conselho de Classe Profissional.
A psicóloga Elisa Walleska Krüger, que é a representante suplente do CFP no CNPCT, destaca que a tortura se estabeleceu no mundo como forma de opressão, e por isso ela persiste nas estruturas do Estado. “Na verdade a tortura se estabeleceu, não apenas no Brasil como em vários outros locais, como uma forma de opressão, de poder e de obtenção de ganhos, e isso faz com que a tortura não seja localizada única e exclusivamente no ambiente policial ou prisional, como a maioria das pessoas imagina que seja. A nossa juventude também tem sido muito vítima de tortura, inclusive em instituições de cumprimento de medidas socioeducativas. Então, lamentavelmente a tortura é bem mais disseminada do que nós imaginamos e ela não ficou circunscrita à época da ditadura”, avalia. As práticas de tortura remontam da colonização do continente e foram utilizadas institucionalmente por agentes públicos aos opositores do regime militar na época da ditadura como uma das principais formas de repressão política. No período constitucional esta chaga se disseminou e está dirigida principalmente para os setores empobrecidos, negros, moradores das periferias e pessoas privadas de liberdade.

No começo de junho, o CNPCT enviou um documento para a ONU (Organização das Nações Unidas) denunciando o descaso do governo federal com as políticas de combate à tortura no Brasil. A preocupação do grupo é ainda maior com o governo interino de Michel Temer, que extinguiu a Secretaria Especial de Direitos Humanos e, ao mesmo tempo, nomeou para Ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, ex-secretário de Segurança Pública do governo de São Paulo, conhecido por comandar ações violentas da Polícia Militar naquele estado.

Atividades contra a tortura

Em todo o mundo, a data de 26 de junho foi lembrada. Foram diversas atividades realizadas para que não se esqueça que a tortura é um crime de lesa humanidade, ou seja, atinge a todos nós. Para que não se esqueça e para que jamais aconteça.

A produção audiovisual sobre a tortura e seus efeitos também é vasta, e utilizada por entidades como suporte para o debate e o desenvolvimento de ações sobre o tema. No dia 16 de junho foi apresentado pela primeira vez no Cine ABI por iniciativa do Coletivo RJ Memória Verdade Justiça o filme “Lembrar é Resistir” de Nelson Xavier, sobre as violências  que ocorriam nos espaços prisionais na época da ditadura: tortura, assassinatos e desaparecimentos de opositores políticos, tendo como pano de fundo o DOPS ( Departamento de Ordem Política e Social) do Rio de Janeiro. Há em curso uma forte campanha para transformar este prédio histórico em Centro de Memória.

Outra produção exibida para relembrar a data foi “Trago Comigo” , um filme que aborda a violência da repressão durante o período da ditadura a partir da rememoração histórica de um diretor de teatro e ex-guerrilheiro que ao entrar em contato com um fragmento de lembrança, monta uma peça reconstituindo a memória de um grupo revolucionário esfacelado pela repressão. O filme foi exibido nessa segunda-feira (27), às 14h, no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A sessão é gratuita e após a exibição haverá um debate entre a psicóloga Vera Vital Brasil, integrante da CDH do CFP e membro do coletivo RJ Memória Verdade e Justiça, e o ator Felipe Rocha. Também na segunda-feira (27), às 18h, o Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro, realiza um ato em celebração a data, na sede do Sindicato dos Jornalistas do RJ.

No dia 25 de junho, o Memorial da Resistência da Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo, realizou uma edição do Sábado Resistente, projeto realizado em parceria com o Núcleo de Preservação da Memória Política. O evento, com o titulo “Tortura, crime que os humanos cometem contra os próprios humanos”, contou com a presença da psicóloga e psicanalista Maria Auxiliadora Arantes como palestrante e discutirá o tema que permanece como ponto central de desrespeito dos Direitos Humanos no país: a questão da prática da tortura como elemento de pressão física e psicológica.

Nesta quarta-feira (29), um debate sobre “Justiça hoje e ontem: desafios” no Museu da República, contará com a participação de Fabiana Rousseaux, psicanalista argentina que trabalha com a atenção a sobreviventes de tortura, testemunhas nos julgamentos dos crimes de terror de Estado em seu país, e João Ricardo Dornelles, diretor do Núcleo de Direitos Humanos da PUC-Rio. No dia 30 de junho, em comemoração aos 5 anos do Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura, marcando a data de “Luta contra a Tortura” será lançada a campanha ” Você tem a chave” na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro de 10 às 13hs.

A tortura no Brasil
No período democrático, a tortura continua por parte dos agentes do Estado, como mostra estudo divulgado pela Organização Não Governamental (ONG) Conectas. Os dados apontam que, entre 2005 e 2010, 61% dos casos de tortura no Brasil envolveram agentes públicos. O estudo analisou 455 decisões de segunda instância de todos os Tribunais de Justiça do país. Na maioria das vezes, essa violência ainda se perpetua um contexto de injustiça social.

 Avançar na escuta sobre os efeitos da tortura

Uma iniciativa importante na reparação de pessoas afetadas pela tortura foi lançada em 2013 no Brasil. Trata-se do “Projeto Clínicas do Testemunho” que acrescenta às medidas de reparação já em curso como política de Estado. Este projeto em funcionamento no Rio de Janeiro, São Paulo, Porto Alegre e Florianópolis, tem como foco a escuta e o testemunho dos afetados diretos pela violência de Estado e tem na tortura do passado e do presente a sua representação mais cruel.  
Para garantir atendimento qualificado às vitimas de tortura, a psicóloga Elisa Walleska Krüger aponta que os cursos de Psicologia e de outras áreas que lidam com o tema necessitam de uma reforma curricular para que os profissionais saiam das instituições preparados para realizar uma escuta qualificada.

“Uma coisa muito importante que comecei a perceber desde que integro o CNPCT é a necessidade de uma reforma curricular nos cursos de Psicologia, psiquiatria e serviço social. Nós precisamos capacitar os profissionais à escuta da tortura. Eu observo como professora que muitos dos meus alunos não têm a dimensão nem do que seja a tortura, nem de que ela ainda existe e muito menos como ela se apresenta, assim como desconhecem suas consequências. A gente precisa capacitar os profissionais para que eles conheçam mais sobre a tortura de forma a propiciar uma escuta e um acolhimento”, conclui.