O Conselho Federal de Psicologia (CFP) – representado pela professora de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB), Drª Valeska Zanello – participou, na última sexta-feira (31), de reunião do Grupo de Estudos sobre o Aborto (GEA), em São Paulo. O evento discutiu “Aborto previsto em lei e aborto inseguro, barreiras no acesso e perspectivas, redução de danos”. Especialistas apresentaram pesquisas sobre o funcionamento dos serviços de aborto legal e os procedimentos que têm sido realizados.
Além de Zanello, participaram da reunião Dr. Thomas Gallop, Dr. Jefferson Drezett, Cristiane Cabral (Saúde Pública/USP); Vanessa Canabarro Dias (ANIS), Ana Costa (CEBES), Giberto Palma (FMABC), Luciana Reis (UFT), Leila Adesse, Luiz Corcioli Filho, Maíra Zapater (IBCCRIM), Jolúsia Batista (CEFEMEA), Ana Paula Meirelles (Defensoria Pública), Rullian Emmerick (OAB/RJ), Rozeli Porto (ABA), Mário Monteiro, Maria Eliza Braga e Carmen Simone G. Diniz, dentre outros especialistas.
Segundo a representante do CFP, no encontro foi enfatizada a dificuldade de avanço na discussão acerca da legalização do aborto no Brasil e os tímidos passos que foram dados, quando se compara com outros países como o Uruguai. “O principal motivo apresentado se relaciona às questões morais e religiosas. Apesar de ser um problema de saúde pública, pouco se tem avançado. Só no ano passado, em São Paulo, o aborto foi a principal causa de morte materna”, destacou.
Articulações
Para Zanello, como o (a) psicólogo (a), cada vez mais, tem sido interpelado (a) a dar seu “parecer” sobre a acessibilidade ou não ao aborto legal (por exemplo, dizer se a mulher parece estar falando a verdade ou não), o CFP precisa conhecer como tem sido a atuação dos (as) psicólogos (as) nestes serviços e prestar orientação quanto à postura a ser adotada. “Inclusive de acordo com o nosso Código de Ética (não misturar preceitos religiosos com a prática profissional)”, complementou.
Além disto, a representante do CFP no GEA aponta que é necessário pesquisar como tem sido a participação e a postura dos profissionais de Psicologia em relação ao “regime de inquérito” – no qual, “ao invés de acolher a dor da mulher que busca o serviço de aborto legal, a prática psicológica pode se constituir como uma forma a mais de violência simbólica”, alerta.
Debate
Cristiane Cabral, professora de Saúde Pública da USP, disse que há o obstáculo à garantia de direito das mulheres enfrentado na objeção de consciência, razão apresentada por muitos médicos como motivo para não realizar a interrupção de gravidez – mesmo em casos previstos em lei, como na gravidez decorrente de estupro. Segundo ela, é necessário melhorar a formação dos profissionais de saúde em certos temas, sobretudo ética e relações de gênero. Cristiane também apontou como o tema do aborto deve ocupar o lugar principal dos movimentos sociais feministas.
Vanessa Canabarro Dias, psicóloga, doutoranda na UnB e representante do Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero (ANIS) afirmou que, nos cinco serviços de aborto legal no Brasil que estudou (ao todo 84 profissionais entrevistados), fica evidente um regime de suspeição da palavra da mulher. As equipes acabam por trabalhar como uma equipe pericial. Neste sentido, a palavra da mulher não é suficiente, sendo ela submetida a “testes de verdade”: ela deve apresentar uma história convincente e uma subjetividade específica para ser qualificada como vítima, por exemplo, de um estupro.
Na discussão, os participantes destacaram também quanto o pouco avanço nas discussões sobre o aborto e sua legalização no Brasil reflete valores machistas e patriarcais, que insistem em controlar os corpos das mulheres.
Jefferson Drezett, médico do Núcleo de Saúde Pública da USP, enfatizou que o Brasil estacionou neste tema há 20 anos. Segundo o médico, apesar de estar previsto na lei, o acesso ao aborto legal é dificultado. Em 2013, o número de serviços no Brasil era cotado em 65, mas o Ministério da Saúde proibiu a divulgação dos serviços e os locais onde eles funcionam.
Jolúzia Batista, do CEFEMEA, apresentou um panorama dos Projetos de Lei que estão tramitando no Congresso e o quanto alguns deles colocam em xeque direitos sociais de mulheres e homossexuais.
Rozeli Porto, da Associação Brasileira de Antropologia (ABA), apresentou dados de sua pesquisa realizada no Rio Grande do Norte quee apontou, dentre outras questões, que muitos psicólogos (as) que trabalham nos serviços legais de aborto “aconselham” a mulher a não abortar, utilizando-se de prerrogativas morais e religiosas.