Psicologia, educação e relações de gênero e medicalização em contexto escolar foram os temas discutidos na etapa Sul do 9º Seminário Nacional de Psicologia e Políticas Públicas, promovido pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP) em parceria com os Conselhos Regionais do Rio Grande do Sul (CRP-7), Santa Catarina (CRP-12) e Paraná (CRP-8), dia 28, em Porto Alegre (RS).
Para o presidente do CFP, Rogério Giannini, o conservadorismo presente na sociedade precisa ser enfrentado. “Percebemos a imposição de uma agenda moral sobre uma social e a Psicologia pode contribuir para o desmascaramento desses processos”. A presidente do CRP-RS, Silvana de Oliveira, falou sobre a importância de se refletir sobre o desmonte das políticas públicas, a precarização das condições de trabalho de profissionais da Psicologia e a restrição de acesso a direitos pela população. Jaira Rodrigues, conselheira do CRP-SC, destacou a oportunidade de defender políticas públicas voltadas para a garantia de direitos sociais. “A Psicologia tem contribuído para o desenvolvimento social”.
Psicologia, educação e relações de gênero: a laicidade em foco
No debate sobre Psicologia, educação e laicidade, o foco esteve centrado nas discussões de gênero. A psicóloga Priscila Pavan Detoni, conselheira do CRP-RS e presidente da Comissão de Direitos Humanos, explicou que o Estado laico não é ateu, mas sim um Estado que aceita a pluralidade religiosa. Ela citou exemplos: “O Estado laico não deveria delegar seu papel a instituições religiosas, mas temos visto cada vez mais a aproximação do Estado com comunidades terapêuticas de cunho religioso. Também temos observado o retorno ao assistencialismo ligado a questões religiosas e que está ocupando o lugar das políticas de assistência social.”
O psicólogo Ematuir Teles de Sousa, conselheiro do CRP-SC e membro da Comissão de Direitos Humanos do CFP, falou sobre a necessidade de a Psicologia trabalhar pela garantia dos direitos humanos nas políticas públicas. “É preciso entender que a constituição de categorias de sexo e gênero é feita com base em padrões culturais. Por isso, precisamos apostar em políticas educacionais que considerem a diferença e que questionem esses padrões”.
O psicólogo Pedro Paulo Bicalho, diretor-secretário do CFP, apresentou uma equação que demonstra a constituição da subjetividade do brasileiro, mostrando como a subjetividade construída é permeada de desigualdades e violência, sobretudo contra mulheres, jovens negros e LGBTs. “É por meio das políticas públicas que podemos mudar essa equação, tornar o país menos desigual”. Para Pedro Paulo, a educação deve ser vista como uma ação política e necessária para a transformação social e o enfrentamento do fundamentalismo, que se manifesta pela imposição da verdade, pela disseminação do ódio – que produz medo – e pela vontade de punir as diferenças.
Medicalização em contexto escolar
Nas discussões sobre medicalização em contexto escolar, a psicóloga Flávia Cristina Lemos, da Comissão de Direitos Humanos do CFP, utilizou conceito de Michel Foucault para criticar a estratégia de controle operada pela medicina social. “No aspecto autoritário, o Estado gera, a partir da medicina social, uma maneira de operar um dispositivo de segurança biopolítico na perspectiva de um campo racista de sociedade. Esse mecanismo é utilizado frequentemente para exterminar, segregar, interditar, calar e excluir e na educação as crianças-problema são o alvo, pois têm dificuldade de concentração e de aprendizagem.”
A psicóloga Queila Abigail Trojack, da Comissão de Psicologia Escolar do CRP-PR, também identificou na estratégia da medicina social um aparato de adaptação ao mercado de produção e consumo. “Quem não consegue ingressar nessa linha de ensino e de rendimento não é bom aluno. Acaba tachado como aquele que não para quieto, que não aprende, que tem déficit de atenção ou de hiperatividade. De onde surgem essas estatísticas? A educação precisa questionar seu papel nesse contexto.”
O psiquiatra infantil Ricardo Lugon Arantes, professor do Instituto Educacional Novo Hamburgo, disse que a estratégia da medicalização não tem, necessariamente, relação com a prescrição de fármacos. “O problema é achar que o papel do professor seja rastrear problemas e doenças e encaminhar crianças que não aprendem para um neurologista.” Ele lembrou que a demanda escolar por laudos psicológicos não é apenas indevida, como ilegal. “O laudo é um documento carregado de significados e valores. É compreensível a angústia de um professor que não sabe o que fazer com um aluno, mas construir redes de supervisão e proteção diminui essa sensação.”
A conselheira federal Marisa Helena Alves, do Centro de Referências Técnicas em Psicologia e Políticas Públicas (Crepop), chamou atenção para o desmonte das ações de inclusão social do país ao longo dos últimos anos. “Há várias sinalizações sobre qual deve ser nosso papel nesse contexto: o de resistência. O desafio agora é pensar novos modos de fazer essa resistência.”
Com informações do CRP-RS.