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12/06/2019 - 11:59

CFP defende suspensão do Decreto que inviabiliza Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura

Governo federal exonera peritos responsáveis por vistoriar violações de direitos humanos em instalações de privação de liberdade

CFP defende suspensão do Decreto que inviabiliza Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura

Os 11 peritos do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), responsáveis por vistoriar violações de direitos humanos em instalações de privação de liberdade, como presídios, manicômios e as chamadas Comunidades Terapêuticas, foram exonerados nesta terça-feira (11), pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, por meio do Decreto Nº 9.831. O Conselho Federal de Psicologia (CFP) repudia a ação, que enfraquece o enfrentamento à tortura, maus tratos, tratamentos cruéis, desumanos e degradantes que assolam os locais de privação de liberdade no país.

O Decreto prevê que a participação de peritas(os) em vistorias passa a ser considerada prestação de serviço público sem remuneração. Além de não remuneradas(os), o decreto determina que as(os) voluntárias(os) não podem ter vínculos com “redes e a entidades da sociedade civil e a instituições de ensino e pesquisa, a entidades representativas de trabalhadores…”. O ato presidencial ainda extingue a exigência de critérios de raça, etnia e gênero para composição do Comitê.

Com o decreto, a nomeação das(os) voluntárias(os) passará pelo aval do presidente da República, acabando com a necessária autonomia e independência do órgão. No formato anterior, a escolha do Comitê de Prevenção e Combate à Tortura era soberana, cabendo ao presidente somente fazer a designação do escolhido para o cargo, o que é absolutamente necessário quando se trata de órgão de Estado e não de governo.

Com isso, o Decreto Nº 9.831 desmonta o Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (SNPCT), rompendo os compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro no Combate à Tortura. Um Mecanismo de Combate a Tortura sem peritos independentes, com voluntários que não podem se originar de entidades de defesa dos direitos humanos e nomeados pelo executivo é, de fato, um simulacro, só para dizer que existe um Mecanismo.

Em Comunicado Público, os membros do mecanismo solicitam que o Decreto seja sustado imediatamente para a garantia do exercício amplo, pleno e irrestrito das funções das(os) peritas(os).

Ana Cláudia Camuri, psicóloga e perita do Mecanismo, explica que em quatro anos de funcionamento o Órgão apontou que diversas instituições de privação de liberdade – tanto do Sistema Prisional, quanto do sistema socioeducativo, hospitais psiquiátricos e comunidades terapêuticas – realizavam práticas de maus tratos, tratamentos desumanos, cruéis e degradantes e também tortura. “Visitamos 20 estados, 169 unidades de privação de liberdade de todo tipo. Na área da saúde mental foram 46 hospitais psiquiátricos, 31 comunidades terapêuticas”. Ainda segundo ela, o olhar da Psicologia no trabalho realizado pelo Mecanismo é fundamental para o trabalho.

Um dos frutos desse trabalho do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), em conjunto com o Conselho Federal de Psicologia e a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal (PFDC/MPF), é o Relatório da Inspeção Nacional em Comunidades Terapêuticas, documento inédito que reúne os resultados da inspeção nacional em comunidades terapêuticas, realizada em outubro de 2017, nas cinco regiões do Brasil. A inspeção foi uma ação conjunta do. “O relatório das comunidades terapêuticas apontou várias práticas que se aproximam da tortura, assim como dos hospitais psiquiátricos”, completou Camuri, citando a inspeção nacional realizada em dezembro de 2018 em 40 instituições psiquiátricas de 17 estados das cinco regiões do Brasil, iniciativa conjunta do CFP, MNPCT, Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e Ministério Público do Trabalho (MPT).Este relatório dos hospitais psiquiátricos está previsto para o segundo semestre de 2019.

Prevenção e Combate à Tortura

Criado em 2013, o SNPCT tem como braços o Comitê e o Mecanismo. Os órgãos têm como uma de suas atribuições monitorar estabelecimentos de privação de liberdade e devem atuar de maneira integrada, com o objetivo de coibir a prática de tortura em instituições como unidades prisionais, de medidas socioeducativas, abrigos, locais de permanência para idosos, hospitais psiquiátricos.

As(os) especialistas do Mecanismo são agentes importantes que atuam diretamente vistoriando esses locais e orientando os gestores e autoridades sobre as mudanças necessárias para a superação das práticas de tortura encontradas durante as inspeções.

Com a medida, o governo federal bloqueia a possibilidade de identificação de violações de direitos humanos e intervenções que eram realizadas nas visitas periódicas e regulares a pessoas privadas de liberdade pelo MNPCT.

A falta de inspeções nos locais de privação de liberdade favorece as mudanças previstas na “Nova Política de Saúde Mental”, os hospitais psiquiátricos e comunidades terapêuticas, dentro da Rede de Atenção Psicossocial (RAPs), incentivando assim o retorno à lógica manicomial.

O CFP participa do CNPCT desde sua fundação e foi eleito por unanimidade para integrar o Comitê Nacional em 23 de novembro de 2018, juntamente com órgãos federais e membros da sociedade civil. Porém, até o momento, não houve nomeação e posse das entidades. No CNPCT, o CFP tem contribuído e mobilizado diversas ações na defesa dos direitos humanos neste espaço, como a participação nos Relatórios de Inspeção do Mecanismo e fiscalização das comunidades terapêuticas e hospitais psiquiátricos.