O avanço do conservadorismo contra as pautas da população LGBTI, formas de resistência e leis que garantam os direitos dessas minorias. Esse foi o cerne da audiência pública, realizada nesta quinta-feira (17), na Comissão de Direitos Humanos e Minorias na Câmara dos Deputados, em Brasília. O 17 de Maio é o Dia Mundial e Nacional da Luta Contra a Homofobia.
Proposta pela deputada federal Luizianne Lins (PT/CE), o encontro discutiu a agenda legislativa pelos direitos LGBTI+, em especial o Projeto de Lei Dandara, nº 7.292/2017. A lembrança de Dandara dos Santos, travesti assassinada em Fortaleza, há mais de um ano, também marcou o evento, no qual a conselheira Sandra Sposito representou o Conselho Federal de Psicologia (CFP).
Na audiência, o abaixo-assinado Dia NÃO à “cura gay”!, da All Out e Aliança Nacional LGBTI+ (ALGBTI), foi entregue oficialmente à CDHM. O documento, com mais de 43.800 assinaturas, surgiu após um juiz do Distrito Federal ter decidido que profissionais da Psicologia poderiam oferecer atendimento profissional pertinente à reorientação sexual. Na prática, essa decisão abre brecha para tratamentos ou terapias que prometem corrigir a orientação sexual ou identidade de gênero de alguém, a chamada “cura gay”.
Agenda pelos direitos LGBTI+
Para a conselheira Sandra Sposito, a pauta LGBTI tem passado por avanços, mas também retrocessos. Ela explicou que o CFP, historicamente, tem sido alvo prioritário dos avanços de propostas conservadoras, citando os processos judiciais e legislativos contra duas resoluções da autarquia que versam sobre o tema: a 01/99 e a 01/18. Segundo ela, o discurso conservador atualmente está voltado no sofrimento psíquico que essas pessoas sofreriam por serem LGBT. “Tratam como se o CFP quisesse impedir o fim desse sofrimento. A solução dada simplesmente deixar de ser o que se é. Como se esse sofrimento fosse da ordem do indivíduo e não do social.”
Sposito reforça que a Psicologia se recusou historicamente a compactuar com essa opressão contra a população LGBTI. A conselheira destacou a importância da resistência contra essas ações e ressaltou da autarquia estar presente à audiência pública, “caminhado junto com movimentos sociais, com parcelas significativas da categoria, historicamente alinhados, vários e várias deputados e deputadas que dão visibilidades às nossas questões. Essa luta é de todo mundo e precisa se encontrar mais”.
Toni Reis, presidente da Aliança Nacional LGBTI+, reapresentou dados da pesquisa sobre violência contra estudantes LGBTI. Segundo os dados de 2017, mais de 5.739 assassinatos contra população LGBTI ocorreram no Brasil entre 1980 e 2017. Reis também listou as ações do parlamento contra a comunidade LGBTI, como a “cura gay” – no caso, os decretos legislativos – ) contra a Resolução 01/99 e o Escola Sem Partido. O dirigente da ANLGBTI+ destacou um seminário realizado com 18 partidos políticos, que firmou compromissos para a aprovação de projetos de lei que versem sobre o estatuto das famílias, o casamento igualitário e a criminalização da homofobia.
Andrey Lemos, presidente da União Nacional LGBTI, contou que o Brasil tem “inúmeras Dandaras”, que, todos os dias, sofrem todo tipo de violência em uma sociedade marcada pelo patriarcado. Ele também destacou a urgência na aprovação de propostas que garantam a vida e a dignidade da população LGBTI. “Precisamos fortalecer a luta por esses dispositivos legais. Que se assuma um compromisso com a vida, com a dignidade dessas pessoas. É preciso ter respeito à população LGBT, que sofre, nos mais diversos ambientes, por conta da discriminação. E nada tem sido feito.”
Symmy Larrat, presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT), alertou a necessidade de se buscar a despatologização das identidades Trans. “Temos de alterar na Organização Mundial de Saúde a nomenclatura de ‘incongruência de gênero’. Essa luta não pode ficar de fora do dia 17 de maio”. Larrat lembrou a luta pela aprovação do PLS nº 7292/2017 – contra o LGBtcídio – e a importância na ocupação de espaços e de sensibilização dos deputados para que se continue fazendo resistência contra a pauta conservadora.
Irina Bacci, representante do Coletivo de Feministas Lésbicas, reforçou a dívida histórica do Congresso Nacional. “A Constituição de 1988 não contemplou o movimento LGBTI”.
Lei Dandara
Dona Francisca Ferreira, mãe de Dandara dos Santos, visivelmente emocionada, agradeceu as manifestações de solidariedade e de luta por justiça e também falou sobre a necessidade de aprovação do Projeto de Lei nº 7.292/2017. O PL, de autoria da deputada federal Luizianne Lins (PT/CE), altera o art. 121 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), para prever o LGBTcídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio, e o art. 1o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, para incluir o LGBTcídio no rol dos crimes hediondos.
A proposição é conhecida como “Lei Dandara”, pois em março de 2017, em Fortaleza, a travesti Dandara dos Santos foi torturada, alvejada por tiros e espancada por 12 homens antes de ser assassinada. O assassinato da Dandara, assim como os crimes praticados contra homossexuais e transgeneros não possuem motivação material ou passional, são motivados essencialmente pela aversão à condição sexual das vítimas.