Nota de repúdio à matéria veiculada na Revista SIMERS em março, editada pelo Sindicato Médico do Rio Grande do Sul. A matéria sob o título “As prerrogativas do psiquiatra e as do psicólogo” traz uma entrevista da psiquiatra Laís Legg Rodrigues:
Nossa primeira manifestação de estranheza é em relação a disposição do SIMERS de publicar uma entrevista que caminha no sentido contrário do processo de integração das 14 profissões de saúde, permite o desrespeito a uma profissão reconhecida pela sociedade brasileira e reforça posições corporativistas das mais mesquinhas, na medida em que não colocam em primeiro plano a vontade e a luta por um serviço de saúde digno e de qualidade para nosso Brasil. Na medida em que se oferece este espaço para a divulgação destas posições, sem contraposições, se toma a decisão de reforçá-las, assim nossas críticas aos conteúdos da entrevista da Dra Legg podem ser estendidas à SIMER RS.
A doutora demonstra com suas respostas uma visão antiga e ultrapassada de doença e de saúde. Hoje, as tendências buscam integrar conhecimentos de aspectos do humano que se achavam isolados, como o orgânico, o psicológico, as condições de vida, os hábitos.
A Psicologia atua onde houver humano e onde houver a presença da dimensão psicológica, seja na saúde ou na doença. As concepções contemporâneas de doença já falam na importância de se olhar para as condições psicológicas de quem adoece. A doutora parece desconhecer estes conhecimentos e mesmo as formas interdisciplinares que se instituíram com sucesso no campo da saúde. Não podemos querer um atendimento à doença que seja da época de Hipócrates.
Há equívocos de psicólogos nos tratamentos? Sim. Mas sabemos muito bem que são muitos também os equívocos médicos. Não podemos misturar nestas discussões as incompetências e as condições adequadas para um bom tratamento na área da saúde, no Brasil.
A doutora é claramente corporativista e pensa o tratamento da doença como se fosse sinônimo de tratamento médico. A saúde é hoje campo e interesse de muitos (14 áreas) profissionais que têm construído seus exercícios profissionais e suas pesquisas com vistas a uma prestação de serviço multidisciplinar, rica, complexa e completa, abarcando a totalidade dos pacientes. Nossos conhecimentos não são totalizadores; e por isso precisamos, para fazer um bom serviço, de muitos saberes.
Por que só médicos podem dar atestados de afastamento do trabalho? Porque querem manter este filão do mercado de trabalho exclusivamente nas mãos deles, pois, a rigor, alguém pode se afastar do trabalho porque está em estado de stress porque foi vítima de alguma situação traumática. Estas pessoas estão em sofrimento, apesar de não estarem doentes e quem saberá disto e poderá tratá-la é um psicólogo. E isto serve para muitas das profissões da área da saúde.
A doutora também desconhece as ações dos Conselhos Profissionais de Psicologia para regular o campo dos testes. Os psicólogos tomaram nas suas mãos os testes que até então, estavam nas mãos das editoras. Há 4 anos funciona, no Conselho Federal de Psicologia, uma comissão que avalia as condições de uso de todos os testes psicológicos. Os psicólogos e suas entidades sabem da importância de exercerem este controle em nome dos interesses da sociedade e da qualidade do serviço que lhes é prestado.
Os psicólogos acreditam que seja de extrema importância a união de todo o setor de saúde para a construção de um serviço de qualidade à população brasileira. Temos atuado sempre guiados por este princípio e lamentamos que uma profissional da psiquiatria apresente suas opiniões sem atualizá-las e sem respeitar os psicólogos que têm buscado, a cada dia e ininterruptamente, melhorar a qualidade técnica e ética de suas intervenções, inclusive reunindo forças com os médicos psiquiatras para muitas lutas necessárias em nosso país, como a reforma psiquiátrica, a qualificação das psicoterapias (temos hoje uma entidade conjunta Associação Brasileira de Psicoterapia –ABRAP), os serviços de saúde mental.
O CFP isenta-se aqui de relatar os vários casos de erros médicos que têm se tornado público e mesmo justificado a formação de organizações sociais das pessoas vítimas de erro médico.
Cabe ainda salientar que, hoje, no Brasil, existem apenas 5000 psiquiatras. Os psicólogos são 130 mil profissionais, estando a maioria deles na área da saúde.
A Psicologia é por definição do Ministério da Saúde uma profissão da área da saúde. Aliada a outras 13 profissões, incluídos os médicos.
O CFP repudia a manifestação da Dra. Legg não pela pobreza de suas opiniões, mas por não se constituir como um apoio a uma luta comum aos profissionais da área da saúde: a por um serviço de saúde à população que tenha qualidade técnica, ética e seja comprometida com as necessidades sociais do povo brasileiro. Esta é a nossa luta!
Conselho Federal de Psicologia