O Dia da Visibilidade Trans é celebrado todo dia 29 de janeiro, desde 2004. A data tem o objetivo de ressaltar a importância da visibilidade e o respeito às pessoas travestis e transexuais na sociedade brasileira. Nesta data, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) celebra o aniversário de 1 ano da Resolução CFP nº 01/2018, que orienta a atuação profissional de psicólogas(os) para que travestilidades e transexualidades não sejam consideradas patologias.
A norma tem o objetivo de impedir o uso de instrumentos ou técnicas psicológicas para criar, manter ou reforçar preconceitos, estigmas, estereótipos ou discriminação e veda a colaboração com eventos ou serviços que contribuam para o desenvolvimento de culturas institucionais discriminatórias.
Segundo o conselheiro do CFP, Pedro Paulo Bicalho, a Resolução 01/18 é um documento histórico que faz da Psicologia brasileira uma importante aliada às lutas trans. “A Resolução é fruto de diversas discussões no âmbito do Sistema Conselhos de Psicologia e apresenta importantes afirmações ético-políticas acerca da transexualidade e da travestilidade, assim como de outros conceitos fundamentais para o debate sobre despatologização das identidades trans e da garantia de autonomia de cada sujeito para a autodeterminação em relação às expressões e identidades de gênero”, explica.
A conselheira do CFP, Sandra Sposito, ressalta que quando a Resolução 01/18 foi lançada, posicionou a Psicologia no Brasil na afirmação da despatologização das pessoas travestis e transexuais. “A resolução é uma força muito grande para a luta das pessoas transexuais e travestis, para que não sejam entendidas como desviantes do padrão e possam enfrentar em determinados espaços a interdição de acesso aos direitos”, afirmou.
Sandra cita o reforço que a Resolução do CFP ganhou com a decisão da Organização Mundial de Saúde (OMS), que retirou as identidades trans da lista de transtornos mentais. “A alteração da 11ª versão da CID, veio para legitimar a luta das pessoas travestis e transexuais, desconstruindo essa visão fora do padrão”, avalia.
Antes, a CID-10, formulada há 28 anos, incluía as questões de identidades de gênero no rol dos “transtornos mentais, comportamentais ou do neurodesenvolvimento”. A nova versão será apresentada aos Estados-Membros das Nações Unidas na Assembleia Mundial da Saúde, em maio de 2019.
A Resolução 01/18 também está em sintonia com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), publicada em março de 2018, que por unanimidade autoriza transexuais e transgêneros a alterarem o nome no registro civil sem a realização de cirurgia de mudança de sexo. Além disso, transexuais e transgêneros podem pedir para mudar o nome e o gênero sem precisar passar por avaliação médica ou psicológica.
“O reconhecimento da autodeterminação é muito importante, pois é a partir da própria afirmação identitária que as psicólogas e psicólogos devem compreender o gênero da pessoa”, acrescenta Sandra.
A Resolução também impede que profissionais de Psicologia se pronunciem publicamente afirmando a patologização da travestilidade ou transexualidade.
Atuação profissional da Psicologia
A psicóloga Céu Cavalcante, que também é mulher trans, ressalta a importância da data para o segmento. “Como mulher trans, o dia da visibilidade acaba adquirindo um caráter de convidar à reflexão sobre nossas lutas, a pensar nos contextos das vidas trans em diferentes contextos e entender como essas vidas tornam a minha própria vida mais possível”, avalia.
“Estou num lugar de ao mesmo tempo ser sujeita dessa Resolução e também a quem ela se dirige, no sentido de ser usuária que acessa serviços de psicólogas, mas também ser a profissional de Psicologia que está pensando de dentro sobre a prática, o campo de atuação e a teoria, então essa é uma discussão que me toca muito de perto por atravessar por esses dois lados”, explica Céu, que já atuou na Comissão de gênero do Conselho Regional de Psicologia de Pernambuco (CRP-02).
Céu Cavalcante explica que a Resolução 01/18 toca em algumas feridas sociais que seguem abertas. “A resolução convida profissionais da Psicologia a olharem para um segmento da população que tem uma expectativa de vida de 30 anos, ela nos convida a nos posicionarmos eticamente diante de um conjunto de violências”.
A psicóloga explica que as pessoas trans são sistematicamente excluídas de todos os espaços institucionais. “A Psicologia não poderia, portanto, ser mais um dos vários campos profissionais a corroborar com a exclusão e violência transfóbica, seja se ausentando do debate ou sendo ela própria agente dessa violência”, conclui.
Violações de Direitos Humanos
Travestis e Transexuais são uma das populações mais atingidas pela violência e discriminação no Brasil. Dados do Disque Direitos Humanos (Disque 100), canal do governo federal que acolhe denúncias de violações de direitos humanos, apontam que a violência física, a violência psicológica e a discriminação foram as principais violações denunciadas, respectivamente, ao canal em 2017 e primeiro semestre de 2018.
O relatório do Grupo Gay da Bahia revela que 164 pessoas travestis e transexuais foram mortas no Brasil em 2018. Em termos relativos, as pessoas trans representam a categoria sexológica mais vulnerável a mortes violentas.
Na próxima quinta-feira (31), o CFP sediará parte das atividades da “V semana da visibilidade Trans Hanna Susart”, organizada pela Rede Nacional de Pessoas Trans (REDTRANS). Em 2018, o Conselho Federal de Psicologia recebeu da RedTrans o prêmio “Parceiros do combate à Transfobia em 2017″, pela sua atuação em prol da população trans.
O CFP possui um site despatologizacao.cfp.org.br com conteúdo voltado à temática. No endereço, podem ser encontradas legislação, notícias e demais assuntos relacionados ao tema.