O Conselho Federal de Psicologia (CFP) realizou, nesta sexta-feira (24/3), ato de desagravo a três entidades e seis profissionais da Psicologia processados, nos últimos três anos, por questionarem posicionamentos da autarquia em notas públicas. O colegiado confirmou que os procedimentos jurídicos para retirada das ações já foram oficializados.
Ao todo, o CFP solicitou arquivamento de quatro interpelações judiciais e uma extrajudicial interpostos contra a Associação Brasileira de Ensino de Psicologia (Abep) e os diretores Ângela Soligo, Irani Tomiatto de Oliveira, Fabiana Pinheiro Ramos e Júlio Schruber Júnior (processo nº 40861-23.2015.4.01.3400; o Sindicato dos Psicólogos do Estado de São Paulo (1000253-59.2016.8.26.0050); a psicóloga Evelyn Sayeg (1000250-07.2016.8.26.0050); o psicólogo Moacyr Miniussi Bertolino Neto (1000252-74.2016.8.26.0050); e a Frente Antimanicomial de São Paulo (interpelação extrajudicial).
A decisão do XVII Plenário do CFP de desistir dos litígios e fazer um desagravo público aos citados ocorreu pelo entendimento de que as ações representavam tentativa de cerceamento da liberdade individual de expressão e manifestação política de pessoas e entidades, tendo em vista que tiveram como motivação a divulgação de dois textos: a carta aberta “A Abep está de mudança” e a “Nota de Repúdio ao Golpe da Saúde Mental”.
“Chamamos neste ato de desagravo entidades e pessoas alvos desses processos para afirmar o compromisso de que esta gestão do CFP não permitirá que instrumentos jurídicos sejam utilizados como método de disputa política”, enfatizou o presidente Rogério Giannini. Ele ressaltou a gravidade e os danos produzidos por esse tipo de expediente: “Ações como esta penalizam antes mesmo do julgamento pois o acusado precisa gastar energia e recursos financeiros para se defender.”
A vice-presidente do CFP, Ana Sandra Fernandes, disse que o ato reafirma o compromisso da gestão com a democracia, “um valor que deve ser construído todos os dias, de todas as formas”.
Para Norma Cosmo, tesoureira do CFP, o emprego da judicialização neste caso específico representou uma disputa política “desleal, desigual e injusta que criou um desgaste na relação do CFP com as entidades da Psicologia e dentro do próprio Sistema Conselhos”.
O diretor Pedro Paulo Bicalho explicou que a decisão do CFP de retirar as ações e promover um desagravo público está embasada nos princípios da “liberdade de expressão da atividade intelectual”, garantidos no art. 5º da Constituição Federal de 1988, e no inciso III do Código de Ética Profissional dos Psicólogos, que define o exercício da Psicologia pautado “no respeito e na promoção da liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano”. “Estamos aqui para lembrar que é pauta da Psicologia brasileira problematizar todos os processos de medicalização, patologização, criminalização e judicialização da vida. Processos judiciais como estes que estamos encerrando hoje são produtores de sofrimento e entendemos que não cabe à Psicologia brasileira produzir sofrimento psíquico desnecessário. Existem outros mecanismos de construção das relações”, afirmou.
Respeito à democracia – A psicóloga Fabiana Pinheiro Ramos, ex-diretora da Associação Brasileira de Ensino de Psicologia citada em uma das ações, acredita que a atitude do CFP ultrapassa o simbolismo da retirada dos processos. “Sinaliza abertura para o diálogo com as entidades e o respeito à democracia.”
Já a presidente da Abep, Diva Conde, falou que a atitude do CFP contribui para recuperar a dignidade da profissão de quem se propõe a cuidar das subjetividades, de quem trabalha para observar e lidar com os conflitos. “Coerência, lealdade, solidariedade e justiça. Esta é a política que fazemos”, resumiu.
“A política do CFP deve ser a política adequada a todos os tempos, deve ser a luta que respeita as pessoas e os direitos humanos”, afirmou Moacyr Miniussi Bertolino Neto, um dos acionados por conta da “Nota de Repúdio ao Golpe da Saúde Mental”.
Além de ratificar publicamente a retirada das ações, o XVII Plenário do CFP assumiu o compromisso de que, em hipótese alguma, o caminho da judicialização será utilizado pelo colegiado como instrumento de gestão.