Subsidiar o debate da Comissão de Direitos Humanos sobre internação compulsória de dependentes químicos em unidades terapêuticas no Brasil foi o objetivo da audiência pública realizada na semana passada, no Senado. O tema é uma das principais controvérsias do Projeto de Lei da Câmara 37/2013, que altera o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (Sisnad) e do Projeto de Lei do Senado 111/2010 que tipifica o uso de drogas.
O requerimento foi feito pelo senador Humberto Costa (PT-PE). Especialistas defenderam uma abordagem acolhedora e intersetorial, tendo a internação em hospitais como último recurso. A psicóloga e colaboradora do CFP, Márcia Totugui, representou a presidente da autarquia Mariza Borges no debate. Para ela, houve um avanço nos diálogos. “Se a comissão continuar nessa linha, teremos um caminho próspero”, estima.
Mesmo com avanços, Márcia Totugui pondera que é preciso dar maior visibilidade à rede de atenção psicossocial. “A política de saúde mental se volta para a questão do uso de drogas, e a rede construída em torno dela é pouco conhecida por quem não é da saúde”, disse. “Falta articulação entre as políticas, pois vemos trabalhos isolados e a saúde acaba assumindo responsabilidades de outras áreas”, completa.
A colaboradora frisou o posicionamento do CFP, enfatizando a necessidade do cuidado com os sintomas da dependência, que é um problema social. “Não podemos cair no erro de uma política reducionista”, alerta. Ela defende a atuação com dependentes feita nos Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (CAPS/AD), com internações programadas para atender o usuário. “A remoção para hospitais gerais seria apenas em momentos crise, mas sem leitos psiquiátricos”, reforça.
Para o coordenador de Saúde Mental do Ministério da Saúde Roberto Tykanori, existe uma judicialização da saúde no intuito de forçar a pessoa a um tratamento sem intenção médica. “Isso é problemático porque esse tipo de medida individual não faz justiça, pelo contrário, gera privilégios e causa desequilíbrio no SUS em relação aos demais brasileiros que também utilizam os serviços”, frisa. Ele lembrou que o termo “internação forçada” é utilizado apenas no Código Penal, em decorrência de um processo criminal, longe de casos que afetam a saúde.
Já o secretário nacional de Políticas sobre Drogas do Ministério da Justiça (Senad), Vitore Maximiano, falou da importância do tratamento voluntário sem privação de liberdade. De acordo com dados da pesquisa realizada pela Fiocruz a pedido do Senad, divulgada em 2013, 80% das pessoas que fazem uso regular de crack têm interesse de buscar tratamento.
A expectativa, segundo Maximiano, é que sejam construídos CAPS/AD em todas as regiões do País, além da ampliação dos consultórios de rua para busca ativa de pessoas em situação de vulnerabilidade social.
A psicóloga e colaboradora Márcia Totugui, juntamente com a colaboradora Loiva De Boni Santos do Coletivo Ampliado, representam o CFP no Conselho Nacional de Álcool e Drogas (Conad).
Alteração na Lei
No dia 7 de março, o CFP encaminhou ao relator do PLC 37/2013, o senador Antônio Carlos Valadares (PSB-SE), mais de 20 sugestões de mudanças no projeto que promove ampla alteração no Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (Sisnad). O projeto estava em trâmite na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC) do Senado e a votação foi adiada no dia 26 de março por prazo indeterminado.
O pedido foi feito pelo próprio relator do projeto. Um dos motivos alegados por ele foi a necessidade de analisar o material enviado pelo CFP. O documento foi elaborado por um Grupo de Trabalho formado pela autarquia e pelos CRPs. Uma das sugestões é dar nova redação ao dispositivo que fala sobre a forma de cadastramento das Comunidades Terapêuticas, um dos temas mais controversos da proposta.
No texto atual, a proposta é que as normas de referência para o funcionamento das “comunidades terapêuticas acolhedoras” e de seu cadastramento sejam definidas pela Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad). A sugestão do documento elaborado pelo CFP e Regionais e enviado ao relator é de incluir a participação do Ministério da Saúde.
Assim, o cadastramento seria feito com base em critérios já adotados pelo Ministério da Saúde e o monitoramento dessas instituições cadastradas seria realizado em parceria pela Senad e pelo Ministério, com ampla divulgação à sociedade civil.
Outro ponto observado no documento é em relação à rede de atenção ao usuário. O artigo 23 faz referência a ela, mas ao longo do PL aparecem menções ora ao atendimento dentro da rede, ora fora dela. Por isso, foi enfatizada no documento, a importância de esclarecer esse ponto para não correr o risco de haver sobrecarga na rede pública sem investimento adequado.
No texto do PL é possível observar a previsão de Comunidades Terapêuticas para realizar o acolhimento de uma população, mas não as outras fases do tratamento, que deverão então ser acolhidas pela rede pública.