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19/05/2014 - 12:08

Luta Antimanicomial

Livro retrata horrores do Hospital Colônia de Barbacena

Luta Antimanicomial

Créditos: DivulgaçãoA trágica história do Hospital Colônia de Barbacena, que culminou na morte de 60 mil pessoas, é tema do livro “Holocausto Brasileiro – Genocídio: 60 mil mortos no maior hospício do Brasil”, que foi lançado no sábado (17/5), às 15h, no Espaço Plínio Marcos, na Tenda na Feira de Artes da Praça Benedito Calixto, em Pinheiros (SP). O evento aconteceu durante a comemoração do 15º aniversário do projeto O Autor na Praça, voltado para difusão de literatura.

Na ocasião, a autora da publicação, a jornalista Daniela Arbex recebeu o Prêmio Carrano de Luta Antimanicomial e Direitos Humanos.  Em sua obra, a escritora traz à tona um dos capítulos mais sombrios da história brasileira: as barbáries praticadas com a conivência de médicos, funcionários e também da população no maior hospício do País, localizado na cidade de Barbacena (MG), durante grande parte do século 20.

Pelo menos 60 mil pessoas morreram na Colônia. A maioria havia sido internada à força. Cerca de 70% não tinha diagnóstico de doença mental. Eram epiléticos, alcoólatras, homossexuais, prostitutas, gente que se rebelava ou que se tornara incômoda para alguém com mais poder. Eram meninas grávidas violentadas pelos patrões, esposas confinadas para que o marido pudesse morar com a amante, filhas de fazendeiros que perderam a virgindade antes do casamento, homens e mulheres que haviam extraviado seus documentos. Alguns eram apenas tímidos. Pelo menos 33 eram crianças.

Quando chegavam ao hospício, suas cabeças eram raspadas, suas roupas arrancadas e seus nomes descartados pelos funcionários, que os rebatizavam. Daniela Arbex devolve nome, história e identidade aos pacientes, verdadeiros sobreviventes de um holocausto, como Maria de Jesus, internada porque se sentia triste; ou Antônio Gomes da Silva, sem diagnóstico, que, dos 34 anos de internação, ficou mudo durante 21 anos porque ninguém se lembrou de perguntar se ele falava.

Os pacientes da Colônia às vezes comiam ratos, bebiam água do esgoto ou urina, dormiam sobre capim, eram espancados e violados. Nas noites geladas da Serra da Mantiqueira, eram deixados ao relento, nus ou cobertos apenas por trapos. Pelo menos 30 bebês foram roubados de suas mães.

As internas conseguiam proteger sua gravidez passando fezes sobre a barriga para não serem tocadas. Mas, logo depois do parto, os bebês eram tirados de seus braços e doados. Alguns morriam de frio, fome e doença. Morriam também de choque. Às vezes os eletrochoques eram tantos e tão fortes, que a sobrecarga derrubava a rede do município.

Nos períodos de maior lotação, 16 pessoas morriam a cada dia. Ao morrer, davam lucro. Entre 1969 e 1980, 1.853 corpos de pacientes do manicômio foram vendidos para 17 faculdades de medicina do país, sem que ninguém questionasse. Quando houve excesso de cadáveres e o mercado encolheu, os corpos foram decompostos em ácido, no pátio da Colônia, diante dos pacientes, para que as ossadas pudessem ser comercializadas. Nada se perdia, exceto a vida.

O início dos anos 60, depois de conhecer a Colônia, o fotógrafo Luiz Alfredo, da revista O Cruzeiro, desabafou com o chefe: “Aquilo é um assassinato em massa”. Em 1979, o psiquiatra italiano Franco Basaglia, pioneiro da luta pelo fim dos manicômios que também visitou a Colônia, declarou numa coletiva de imprensa: “Estive hoje num campo de concentração nazista. Em lugar nenhum do mundo, presenciei uma tragédia como essa”.

Sobre a autora

Daniela Arbex é repórter especial do jornal Tribuna de Minas há 18 anos, tem no currículo mais de 20 prêmios nacionais e internacionais, entre eles três prêmios Esso, o mais recente recebido em 2012 com a série “Holocausto brasileiro”e dois prêmios Vladimir Herzog (menção honrosa).

O currículo da jornalista também inclui o Knight International Journalism Award, entregue nos Estados Unidos (2010), e o prêmio IPYS de Melhor Investigação Jornalística da América Latina e Caribe (Transparência Internacional e Instituto Prensa y Sociedad), recebido por ela em 2009, quando foi a vencedora, e 2012 (menção honrosa). Em 2002, ela foi premiada na Europa com o Natali Prize (menção honrosa).

 

 Fonte: Geração Editorial