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07/03/2007 - 15:27

Pesquisa vai avaliar programação da TV

Ministério da Justiça quer colher opiniões em 10 capitais brasileiras

Uma criança brasileira assiste, em média, três a quatro horas de televisão por dia, o que significa que, em um ano, ela passa entre um mês e meio a dois meses na frente do aparelho. No país, a atividade é a segunda que mais toma o tempo dos jovens, depois da escola, muitas vezes servindo como principal fonte de lazer. A discussão sobre a quantidade e a qualidade da exposição das crianças e adolescentes à TV vem tomando corpo no Brasil e virando alvo de uma série de ações governamentais que passam, por exemplo, por mudanças na classificação indicativa dos programas. O assunto vem sendo levado tão a sério que o Ministério da Justiça (MJ) vai realizar a primeira pesquisa nacional para avaliar a opinião de pais, adolescentes e crianças sobre a programação da TV. Dez capitais sediarão o estudo, entre elas o Recife. No Nordeste, também participarão Fortaleza e Salvador. Análises parecidas conduzidas em outros países, como os Estados Unidos, mostram, por exemplo, que conteúdos violentos exibidos na televisão podem influenciar no comportamento dos jovens.

A pesquisa brasileira terá a duração de um ano e servirá de base para um projeto maior, nunca visto no Brasil, que deve durar mais de vinte anos de análise. Segundo o diretor do Departamento de Justiça e Classificação do MJ, José Eduardo Elias Romão, o primeiro estudo, que terminará na metade de 2008, tem como objetivos compreender o impacto da violência e do sexo na formação de crianças e adolescentes e entender as peculiaridades regionais no processo de recepção dos jovens. A exemplo do que já foi feito nos Estados Unidos, a segunda pesquisa precisa de no mínimo duas décadas de execução para acompanhar o desenvolvimento das crianças expostas a determinados conteúdos televisivos e conseguir verificar o que, efetivamente, isso influenciou na sua formação. “Nós precisamos desse primeiro esforço para transformar uma pesquisa de longo prazo em uma ação de estado”, afirma Romão, explicando que os custos desse projeto já devem ser incluídos no orçamento do governo para operíodo de 2008 a 2012.

A finalidade dessas pesquisas, segundo Romão, não é criar objetos de censura e proibir que as crianças assistam a determinados conteúdos, mas produzir subsídios para trabalhar o assunto, inclusive com os pais. “Nunca se estudou como a TV brasileira produz costumes e culturas ou como as imagens chegam, impactam e condicionam a infância. Queremos contribuir para a definição de políticas públicas para a criança e o adolescente”, afirma. Estudiosos sobre o assunto defendem que ações a respeito da exposição das crianças à televisão não são de responsabilidade exclusiva dos pais, excepcionalmente quando se fala em TVs abertas, que são concessões públicas. Mas, são os pais, no final das contas, que devem ficar atentos ao que os filhos assistem e acompanhar que tipo de efeito isso pode ter na formação deles.

Obrigações – A fonoaudióloga Carmelita Vasconcelos acredita que a TV pode influenciar o comportamento dos filhos e limita a exposição deles a programas televisivos. Ela é mãe de dois garotos, Vinícius e Daniel, um de dez e outro de 13 anos. Carmelita tem canal por assinatura, mas controla o acesso dos meninos através de senha e nunca deixa eles assistirem TV depois das 23h. Mas, ela não faz só proibir. A fonoaudióloga conversa com os filhos sobre o que eles assistem. “Eles estudam de manhã, à tarde cobro as obrigações deles com as tarefas da escola. Além disso, eles têm ocupações extra-escola. Acho que a TV pode influenciar tanto positivamente quanto negativamente. Depende muito do que se vê”, opina.

 

 

Impactos variam segundo o contexto e papel dos pais

 

Os impactos da televisão sobre o comportamento das crianças e dos adolescentes há muito já são analisados em outros países. Nos Estados Unidos, por exemplo, existem mais de mil pesquisas sobre o assunto, o que permite que muitos estudiosos afirmem que os conteúdos televisivos podem, sim, produzir efeitos negativos ou positivos na formação dos jovens. Mas, tudo depende do contexto e do papel dos pais, inclusive ajudando os filhos a compreender o que eles assistem.

O estudo Classificação Indicativa – construindo a cidadania na tela da tevê, realizado pela Agência de Notícias dos Direitos da Infância (Andi) em parceria com o Ministério da Justiça, indica que as cenas de violência são captadas de formas diferentes, dependendo de como elas são inseridas. Isso significa que há interpretações distintas sobre atos de violência praticados por “mocinhos” contra “bandidos”, ausência de penalização ou de dor, presença de armas letais, cenários realistas, existência de sangue e corpos mutilados ou violência doméstica e psicológica. Os filmes em preto e branco, por exemplo, impactam menos o imaginário infantil do que os em cores.

Para o psicólogo Ricardo Moretzsohn, que estuda há oito anos o impacto da mídia sobre as pessoas e faz parte do Conselho Federal de Psicologia, não há dúvidas de que a televisão influencia na formação dos jovens. “Criança é quase como uma esponja. Ela capta tudo, sejam coisas boas ou ruins. Mas, o que me preocupa são os valores que são passados para a criança. Não acho que as crianças vão ver cenas de sexo e violência e vão ficar traumatizadas. Elas têm condições de dar conta, desde que elas tenham um adulto ao lado delas, que as orientem e explique que tipo de valor elas estão assistindo”, afirma. De acordo com Moretzsohn, na média, a idade em que a criança é mais vulnerável é até seis anos. “É preciso entender o contexto. Não é qualquer violência que produz impactos na criança”, lembra Guilherme Canela, da Andi.

 

Prazo até maio para mudar a classificação indicativa

 

Uma das ações do Ministério da Justiça com relação aos conteúdos veiculados nos canais de televisão na rede aberta foi a mudança na classificação indicativa, que precisa ser atendida pelas emissoras até o dia 13 de maio. A primeira alteração a respeito da norma anterior, que é de setembro de 2000, é em relação ao horário. Ao contrário do que ocorria antes, os programas precisam atender aos fusos horários das regiões e não mais estabelecer os programas com base em Brasília.

Outra mudança é a padronização na veiculação da mensagem, com forma e tempo fixos para todas as emissoras. “Isso parece pequeno, mas tem uma grande importância porque facilita as famílias a entenderem que existe um sistema de classificação indicativa, que está presente até no cinema. Antes não funcionava e não permitia que as famílias de fato pudessem decidir porque em algumas emissoras era preciso assistir com uma lupa porque não dava para ver o que o símbolo queria dizer”, avalia o coordenador das Relações Acadêmicas da Andi, Guilherme Canela.

Outra mudança é que agora a classificação precisa informar porque o Ministério da Justiça considerou o programa inadequado para alguma faixa etária.

A empresária Maria do Carmo Pinheiro diz que sempre presta atenção na classificação indicativa, como forma de acompanhar os programas assistidos pelos filhos dela, Maria Clara, de seis anos, e André, 12. No entanto, Maria do Carmo não usa o fator como proibitivo para as crianças. “Não me despertou ainda a necessidade de controlar ou vigiar a TV. Mas, não gosto, por exemplo, que eles assistam violência e, no caso de Maria Clara, cenas de sexo, por ela ser mulher. Até ela já passou a observar a classificação indicativa e a ter curiosidade sobre o que é. Mas, eu presto atenção, principalmente, por causa de André, porque a televisão dele fica ligada 24 horas.”, afirma a empresária.

Por Juliana Colares

Diário de Pernambuco