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16/09/2015 - 14:57

Proibicionismo e aprisionamento

Relação entre políticas antidrogas e manicômios foi discutida na manhã desta quarta, durante seminário em Brasília

Proibicionismo e aprisionamento

Os danos da política proibicionista antidrogas e os reflexos manicomiais a ela relacionados foram tema de debate da segunda mesa do Seminário “A desconstrução da lógica manicomial – construindo alternativas”, realizada na manhã desta quarta (16).

Carlos Magalhães, autor e professor do Centro Universitário Newton Paiva (MG), associou as políticas proibicionistas e de combate às drogas no Brasil aos mitos da transgressão e da ordem social, que se utilizam do uso do conceito de criminalidade para produzir diferenciações entre sujeitos. “Se o abuso de drogas é um problema, a criminalização e a medicalização do tratamento são agravantes. Pessoas tiveram suas vidas destruídas não simplesmente pelas drogas, mas pela prisão, pelo estigma”, afirma.

Para ele, a abordagem acadêmica da “sociologia do crime” muitas vezes contribui para uma percepção equivocada sobre o tema. “Uma característica comum entre as teorias de cunho positivista é usar a criminalidade para diferenciar as pessoas. Tenta explicar a criminalidade antes de explicar o que venha a ser crime. Estuda os produtos sem investigar como foram produzidos, deixando de encarar o direito penal como objeto de estudo e reproduzindo o próprio direito penal, com criminalização e perseguição”, completa.

Magalhães apontou, ainda, a relação entre a manutenção da condição de ilegalidade para determinadas drogas e o interesse econômico por ela gerado. “Ao colocar uma substância qualquer na ilegalidade, dado que a gente vive no capitalismo, é conferida a ela novos atrativos, alcança melhores preços e proporciona maiores lucros. O trabalhador convencional, que não é mais indispensável, vamos deixar que se empreguem nessas atividades. Essas pessoas serão descartadas pela eliminação física, pelo encarceramento, internação”.

Vladimir Stempliuk, integrante da Comissão de Direitos Humanos do CFP, resgatou a trajetória recente das políticas de combate às drogas no país a partir de uma convenção da Organização das Nações Unidas (ONU), que previa o equilíbrio entre estratégias de ações de prevenção e tratamento e de repressão.

“O que presenciamos foi um grande investimento da repressão e menos em ações de tratamento. Em termos de população carcerária, o Brasil está na quarta posição do ranking mundial. Ampliamos uma política que penaliza, centralmente, a nossa população. Que alterações são necessárias para não encarcerar em massa nem matar nossos jovens negros e pobres? Ou o Brasil caminha para uma alteração dessa política ou continuaremos a ver o país bater recordes”, defende.

Stempliuk abordou, ainda, o debate sobre as comunidades terapêuticas no Brasil. Segundo ele, a pressão dessas instituições sobre o governo federal culminou no relaxamento de exigências de seu funcionamento e no aumento da demanda por financiamento público a essas entidades. “É um sistema paralelo que mantém a lógica manicomial, com relações hierarquizadas, ausência de equipe capacitada, onde não há aplicação dos princípios da reforma psiquiátrica”. O representante do CFP sugeriu, nesse sentido, a realização de uma nova inspeção nacional nas comunidades terapêuticas.

Ileno Costa, professor da Universidade de Brasília (UnB) e mediador do debate, reiterou os pontos de vista de seus companheiros de mesa. “Enquanto a gente não fizer minimamente uma discussão sobre esse assunto, as forças sombrias, fascistas e manicomiais se perpetuarão. Proibir e encarcerar para quê? Para controlar e lucrar. Precisamos resgatar a questão do sofrimento humano, derrubar muros, concretos, legais e políticos dos manicômios judiciários”.