Os Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (HCTPs),
no Brasil, são o produto da convergência entre duas
das maiores instituições de controle do sujeito na nossa
sociedade: a Psiquiatria e Direito Penal.
Resultante da fusão entre as técnicas de intervenção asilares psiquiátricas
e a execução penal do Estado aos autores de crimes considerados
portadores de transtornos mentais, o manicômio judiciário,
como é também chamado, consegue representar, a um só tempo, a
radicalização da instituição manicomial e das prisões. Uma instituição
para os considerados loucos cujo estatuto se vale do aprisionamento
para ser ainda pior que um manicômio. Por outro lado, uma prisão
que se reveste do discurso da tutela sanitária para ser ainda mais
eficaz na perpetuação do isolamento e da mortificação do sujeito em
conflito com a lei – muito além do que hoje a Lei permite a uma prisão.
No cumprimento das chamadas medidas de segurança, o sujeito
considerado louco e o autor de crime se encontram em uma
só pessoa. Se, na Justiça penal, a imensa maioria dos alvos preferenciais
das agências de controle punitivo são emudecidos na
condição de criminosos, na medida de segurança dessa mesma
Justiça penal, os direitos e a trajetória do sujeito acusado como
criminoso e louco são suprimidos de forma ainda mais atroz, com
fundamento na indissociabilidade preconceituosa e institucionalizada
quase indissociável entre sofrimento mental e perigo.
É sob o argumento do perigo – ou da periculosidade social,
como dizem os operadores do Direito – que o Estado e nossa sociedade
se permitem trancafiar, muitas vezes perpetuamente, o
sujeito considerado louco que se depara com as instituições de
controle penal, seja por meio das condutas de conflito mais graves,
seja por meio das simples e mais banais contravenções à lei
penal. Ele é sequestrado pelo Estado e pode nunca mais retornar
à liberdade, para tentar um dia voltar perseguir os seus projetos de
vida e felicidade em sociedade.
O Conselho Federal de Psicologia (CFP), em conjunto com a
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Associação Nacional do
Ministério Público em Defesa da Saúde (AMPASA), por meio deste
relatório, vem denunciar a cruel realidade das instituições de
cumprimento de medida de segurança no país, que contribuem
para a preservação de crenças que, noutros tempos, já foram denunciadas
nos versos de Chico Buarque e Milton Nascimento: O
que não tem vergonha, nem nunca terá; o que não tem governo, nem
nunca terá; o que não tem juízo.