Quase mil participantes na modalidade online e um público de cerca de 150 pessoas de diferentes localidades do país participaram do IX Seminário Nacional de Psicologia e Direitos Humanos, realizado nos dias 27 e 28, em Brasília/DF, pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP) para celebrar os 25 anos da Comissão de Direitos Humanos (CDH) da autarquia.
Com o tema Radicalizar o Direito à Vida é Semear Futuros Possíveis, o encontro contou com conferências, diálogos, atividades culturais, premiações e celebrações transmitidas pelas redes oficiais do CFP. O evento colocou em foco temas atuais relacionados aos direitos humanos, como o uso de desinformação para manipular as subjetividades e o compromisso ético-político das Comissões de Direitos Humanos do Sistema Conselhos de Psicologia.
O último dia de atividades teve início com o debate sobre o compromisso ético-político das Comissões de Direitos Humanos no âmbito do Sistema Conselhos de Psicologia. A psicóloga Iolete Ribeiro, que integra a atual CDH/CFP, frisou os três principais objetivos da Comissão: contribuir para a desconstrução das fontes e dinâmicas que produzem violência contra os considerados diferentes; evidenciar a indissociabilidade entre direitos humanos e Psicologia; e incentivar uma cultura de direitos humanos nos espaços onde a Psicologia está presente e nos espaços políticos em que o Sistema Conselhos se faz representar.
Nos últimos dois anos, a Comissão de Direitos Humanos do CFP realizou mais de 150 ações abordando questões relacionadas ao enfrentamento ao racismo contra a população negra e indígena, assim como o enfrentamento ao sexismo e ao capacitismo. “Sempre fui alimentada pelas discussões, debates e conhecimentos produzidos pelas Comissão de Direitos Humanos do CFP”, destacou Iolete Ribeiro.
Do passado ao presente
Durante o diálogo, a coordenadora da CDH/CFP, Eliane Costa, apresentou uma contextualização histórica sobre como as relações raciais foram se construindo no país a partir da conformação da sociedade brasileira.
A psicóloga colocou em questão o conceito de direitos humanos ao explicar que a ideia de direitos dos homens e, posteriormente, de direitos humanos, emergiu no contexto capitalista e colonialista, portanto, a partir da negação da cidadania e de direitos para os povos indígenas, negros e pobres.
Ponderou também que a branquitude (ideologia de superioridade branca que posiciona as pessoas brancas em um lugar psicossocial de vantagens materiais e simbólicas) é elemento central do racismo. “Situações como essas golpeiam direitos civis, sociais, políticos e psíquicos”, destacou.
Eliane Costa ressaltou também a luta da Comissão em defesa da dignidade humana, sinalizando as principais ações em curso e os desafios que ainda deverão ser debatidos pelas futuras gestões da CDH.
“Pessoas historicamente oprimidas resistem, se fazem humanas no dia a dia, no ato de plantarem a roça, de cultuarem o sagrado, de escreverem um livro, de criarem teorias, de fazerem intervenções artísticas, de irem ao trabalho, de sobreviverem ao frio e à fome que há nas ruas, no ato de reivindicarem mudanças estruturais. É essa noção de existência/resistência que tem inspirado o trabalho da atual gestão CDH”, acrescentou.
As temáticas que compuseram as ações da CDH foram trabalhadas de forma singular e interseccionada, em diferentes campos de atuação (do trabalho, da saúde, da assistência social, da justiça, da clínica, do esporte, da educação, da mobilidade, entre outros) e considerando as especificidades regionais brasileiras.
Direitos humanos
A programação do seminário também contou com atividades culturais, dentre elas o “O encontro do Parichara com Tukui – Cantos Sagrados”, entoados pelo escritor indígena Kamuu Dan Wapichana. “Esses cantos, para nós, são sagrados: Canto Parichara e Tukui. Cantos sagrados dos povos de Roraima que foram ensinados pelos animais. Os povos indígenas ainda ouvem os rios, os espíritos da floresta e muitos cantos”, explicou Wapichana.
O filósofo e cantor Tiganá Santana, a partir da epistemologia africana bantu-kongo, também discorreu sobre a versão dos direitos humanos do mundo ocidentalizado. Ele, que é o autor da música oficial da Campanha Nacional de Direitos Humanos do CFP, sugeriu colocar o termo direitos humanos em suspeição, em razão de ter sido inventado pela versão antropocentrista e “por excluir diversas humanidades espalhadas pelo mundo”, ressaltou Tiganá.
O poeta Nêgo Bispo, militante do movimento social quilombola, pontuou que não há direitos humanos sem o desastre de outras vidas. Para ele, direitos humanos são, na verdade, direitos sintéticos, pois, a humanidade sintetiza os direitos em função da sua própria humanidade. “Os direitos humanos são alimentados pelo desastre das outras vidas”.
Prêmio Virgínia Bicudo
A última atividade do Seminário Nacional de Direitos Humanos marcou a entrega do Prêmio Profissional Virgínia Bicudo. O Conselho Federal de Psicologia premiou nove trabalhos teórico-técnicos apresentados com o tema “Práticas para uma Psicologia Antirracista”, nas categorias de experiências individuais e experiências coletivas. A premiação também fez parte do marco dos 60 anos da regulamentação da Psicologia no Brasil.
Os trabalhos inéditos, apresentados sob a forma de artigo técnico ou relatos de práticas embasadas na ciência psicológica, foram julgados por uma Comissão constituída por membros selecionados pela Comissão de Direitos Humanos do CFP. A presidente do CFP, Ana Sandra Fernandes, ainda anunciou que o Prêmio Profissional Virgínia Bicudo será realizado anualmente a partir de 2023.
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