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13/11/2012 - 17:10

Sistema prisional

Seminário destaca políticas públicas.

Quinhentos e trinta e oito mil. Esse é o total da população carcerária no Brasil e não há espaço para todo mundo, já que, de acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), as vagas não chegam a 300 mil, contando os 1.771 presídios existentes no País. Com as superlotações, as prisões sofrem com a ausência de políticas articuladas nas áreas da psicologia, assistência social, justiça e saúde.

Esse contexto pautou a mesa sobre “Trabalho interdisciplinar nas políticas públicas no sistema prisional: articulando redes e construindo laços sociais”. O debate aconteceu na sexta-feira (9/11), na sede do CFP, em Brasília, durante o seminário “Atuação no Sistema Prisional Brasileiro: Desafios e Perspectivas”.

Para a psicóloga do campo jurídico, Márcia Badaró, que atuou por 30 anos no sistema prisional, é preciso mudar a forma de atuação das prisões por meio de uma concepção interdisciplinar, que inclua os profissionais envolvidos com o tema. “As dificuldades são muitas e a burocracia das práticas dificulta qualquer projeto criativo e inovador que fortaleça os laços sociais voltados para a saúde integral da população carcerária”, destaca.

Do ponto de vista da assistência social, a docente do serviço social da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Andrea Torres, enfatiza que a atual concepção do sistema penitenciário é conservadora e desatualizada como projeto profissional ético-político. “Há conflito porque a concepção de cura e tratamento para os presos ainda rege o judiciário e os profissionais da área. Uma conversa de 15 minutos não fornece elementos para um exame criminológico, é preciso um estudo social”, considera.

Para mudar esse cenário, seria preciso realizar trabalhos dentro do sistema prisional, com inspeções periódicas e legislações que promovam os direitos humanos, devolvendo a dignidade e possibilitando a ressocialização dos detentos na sociedade. “O CNJ passou pelos 27 estados e percebeu que não há tratamento penal no Brasil. Muitos presos disseram que ninguém trata o problema psíquico deles”, criticou o coordenador geral do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF/CNJ), Luciano Losekann.

Losekann apontou que as medidas de segurança configuram outro entrave que precisa de solução, com redução de internação e ampliação da liberação de presos. Segundo ele, o Brasil tem hoje 4 mil pacientes em 18 hospitais de custódia em tratamento judiciário. “Soubemos de pessoas que passaram mais de 40 anos nesses estabelecimentos porque não tinham para onde ir e não havia implementação de programas sociais e leis para resolver essa questão. O tempo máximo dessa medida é o apenamento de determinado delito”, enfatiza.

O coordenador geral do DMF/CNJ sugeriu, ainda, que o sistema prisional busque ações que evidenciem o trabalho em conjunto e as políticas públicas no sistema prisional. “A situação atual ainda está incipiente e a construção de redes de articulação é precária, os laços que devem unir os atores sociais ainda são lentos e o CNJ quer servir como articulador nessa área”, sinaliza.

Conforme o agente carcerário Leandro Zaccaro, que enxerga de perto o problema do sistema prisional no país, para que a situação se transforme, é preciso mudar a mentalidade nos cursos de formação de que “bandido bom é bandido morto”. “A formação não é o único problema, o agente é só um ator. Todos os envolvidos contribuem para um panorama lamentável”, diz.

Segundo Zaccaro, é necessário entender, também, que o agente é um colaborador na implantação de políticas públicas e que ele precisa estar inserido em políticas, seminários, cursos de formação de direitos humanos e assistência social. “É ele [agente] que tem a tranca da unidade, conhece os internos e sabe qual tipo de política pode ser desenvolvida e qual não pode”, conclui.

Plano Nacional

Humanizar a questão da criminalização no País é o objetivo central do Plano Nacional de Saúde no sistema Penitenciário (PNSSP), criado em 2004 pelo Ministério da Saúde. Dos 1.771 presídios brasileiros, o plano está em apenas 272. O documento destaca que a promoção de políticas de saúde nesse setor deve contar com uma equipe mínima composta por médico, enfermeiro, dentista, psicólogo, assistente social e técnico de enfermagem.

De acordo como coordenador nacional de saúde do sistema prisional do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), Marden Soares, a expectativa é que esse plano seja mais efetivo e vire uma política, com indicadores de saúde em todas as regiões.

“Nosso intuito é fazer com que a política comece a dialogar para fora do sistema prisional. A partir disso poderemos ter a uma gestão descentralizada, com equipes multiprofissionais, com mais foco na saúde e prevenção de agravos, estruturando uma rede de atenção a saúde com monitoramento e avaliação”, ressalta o coordenador.

Soares adiantou que o plano pretende abordar estratégias específicas voltadas para as detentas, como aumento de exames preventivos do controle do câncer do colo do útero e mama, além de tratamentos contra doenças sexualmente transmissíveis e rede cegonha. No campo da saúde mental, ele sinalizou que a perspectiva é melhorar a entrada e saída de pacientes nos hospitais de tratamento psiquiátrico. “Também queremos instaurar as residências terapêuticas, inclusive para tratamento de pacientes regressos”, destaca.

De acordo com dados do Ministério da Saúde, o cenário atual do sistema prisional é composto majoritariamente por homens jovens, entre 18 e 29 anos, negros e pardos, com origem nas regiões metropolitanas, com educação primária incompleta ou em fase de alfabetização.