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02/09/2016 - 15:08

Psicologia e Práticas Restaurativas na Socioeducação é tema de artigo desta semana

Texto da Revista Psicologia: Ciência e Profissão traz relato de experiência profissional em unidade no Rio Grande do Sul

Psicologia e Práticas Restaurativas na Socioeducação é tema de artigo desta semana

O artigo da edição 36.2 da Revista Psicologia: Ciência e Profissão publicado nessa semana pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP) é “Psicologia e Práticas Restaurativas na Socioeducação: Relato de Experiência”. O periódico, cuja versão eletrônica se encontra na plataforma SciELO, tem toda semana um texto publicado no site do CFP e nas redes sociais.  Assim, o Conselho busca ampliar o conhecimento científico, a fim de expandir o alcance de conteúdos acadêmicos para a categoria e para a sociedade.

O artigo tem como objetivo apresentar um relato de experiência de profissional da Psicologia dentro de uma unidade de Atendimento Socioeducativo de uma cidade no interior do estado do Rio Grande do Sul. Os dados obtidos fazem parte de um estudo maior intitulado “Um Estudo dos Fatores de Risco e de Proteção em Jovens que Cumprem Medida Socioeducativa”. De acordo com o resumo, os resultados mostraram que as práticas restaurativas realizadas naquela instituição “foram apenas os círculos de compromisso”.

A Assessoria de Comunicação do CFP entrevistou uma das autoras do artigo, Iara da Silva Ferrão (Mestre pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). As demais autoras são as docentes da UFSM Samara Silva dos Santos e Ana Garcia Cristina Dias.

Confira a entrevista: 

O que as motivou a fazer a pesquisa sobre esse tema? 

Eu trabalhei no sistema socioeducativo e com adolescentes em egresso do sistema socieducativo, onde realizava algumas práticas restaurativas. Nesses contextos, as dificuldades de realizar as práticas vinham de diferentes lugares, ou seja, desde a pouca ou nenhuma formação específica para realização das práticas, até a (des)crença por parte de algumas pessoas sobre a efetividade das mesmas.  Há algum tempo sou pesquisadora da temática da violência juvenil e a seguir das práticas autocompositivas e consensuais de resolução de conflitos (mediação e Justiça Restaurativa/JR). Dessa forma, as dificuldades da prática e os resultados de pesquisa nessa área me instigaram a escrever esse relato. Durante a realização do curso do mestrado em Psicologia da UFSM, manifestei o desejo de reunir essas vivências em um relato científico. Assim, realizamos o artigo acreditando que o mesmo poderia servir também como uma possibilidade de repercussão na comunidade científica sobre a prática da  JR e suas possibilidades  num contexto tão  singular quanto o do sistema socieducativo.

 

Quais os resultados que você destaca desse levantamento? 

Destacaria as dissonâncias entre as previsões das cartas legais referentes à justiça juvenil, e o que acontece na prática na condução e acompanhamento do cumprimento de Medida Socioeducativa (MSE),  principalmente no que diz respeito à JR. Ainda, o pouco investimento na formação dos socioeducadores para o trabalho com processos e práticas da JR, uma vez que encontram-se  asseguradas no Sistema Nacional Socioeducativo (SINASE) e no Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) há algum tempo. Também destaco a dificuldade de mudança paradigmática sobre um assunto ainda estigmatizado por uma parte da  população brasileira. A temática da violência juvenil ainda encontra-se arraigada em uma cultura da punição e em alguns mitos de que o adolescente é o responsável pela violência  em curso no país.

No contexto de trabalho com adolescente em conflito com a lei, esses mitos acabam fazendo parte da percepção de alguns socioeducadores, o que pode dificultar mudanças paradigmáticas necessárias para os processos que preveem a restauração e a ressignificação do ato infracional.

Outro resultado importante que encontramos no estudo foi com relação ao dia a dia dos profissionais nessas instituições, permeado por uma série de dificuldades que abrange jornada de trabalho, extremamente desgastante e estressante em que colocam recorrentemente suas vidas em risco. Ainda, a falta de um plano de carreira ou formação adequada e espaços apropriados para refeições e outras atividades. Esses fatores, em nossa opinião, podem acabar dificultando a realização de processos restaurativos que exigem por vezes tempo e mudanças em suas práticas de trabalho.

Na sua opinião, como a Justiça Restaurativa pode contribuir para o Sistema Socioeducativo? 

Acredito que a JR pode contribuir em diversos âmbitos do sistema socioeducativo, uma vez que diferentes estudos revelam a necessidade de investimentos e boas práticas num sistema que comprovadamente não está encontrando resolutividade em si mesmo. Dessa forma, fica evidente a necessidade de efetivação de práticas socioeducativas democráticas, articuladas em rede de atendimento das  políticas públicas da infância e juventude. Ainda entendo que a JR é uma possibilidade de avanço no que preconiza o ECA, porque ela apresenta a possibilidade de práticas que oportunizam a  corresponsabilidades nas intervenções institucionais,  na perspectiva de um Sistema de Garantia de  Direitos para adolescentes privados de liberdade, tal qual, preconiza o ECA e SINASE.

Por fim, a JR no contexto de cumprimento de MSE pode ser uma alternativa frente a um modelo de justiça pautado na punição, que tem apresentado poucas possibilidades de ressignificação da experiência para vítimas e autores de atos infracionais. Também uma possibilidade de desconstrução/ construção de um paradigma arraigado pela cultura de punição ao jovem que comete ato infracional. A JR, ao promover a participação ativa de todos os envolvidos numa situação de conflito, inclusive a vítima e a comunidade afetada, acaba promovendo um “olhar” sistêmico e, portanto,  fidedigno sobre a temática  da violência juvenil em curso no país.

Clique aqui e leia o artigo na íntegra.