A história da Psicologia na compreensão das relações étnico-raciais no Brasil, os efeitos psicossociais do racismo e uma “intervenção psicossocial” por meio de uma dinâmica de grupo que busque desenvolver um compromisso político com o sofrimento de quem é oprimido. Esses foram três aspectos abordados pelo professor Alessandro de Oliveira dos Santos durante minicurso de três dias em Brasília.
A atividade foi promovida de quarta-feira (7) a sexta (9) pela Comissão Especial de Psicologia e Diversidade Étnico-Racial do Conselho Regional de Psicologia da 1° Região (CRP-01 – DF) e pela Articulação Nacional de Psicólogas (os) Negras (os) e Pesquisadoras (es) – (Anpsinep) Núcleo DF.
Santos, do Departamento de Psicologia Social e do Trabalho do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP), avalia que a Psicologia tem um papel decisivo na produção étnico-racial do Brasil, mas destaca que ainda falta aos profissionais da área um “letramento” nesse sentido.
“Nós somos pouco alfabetizados em discutir o tema das relações étnico-raciais. Eu acredito que para tratarmos dessas questões precisamos investir em um ‘letramento étnico-racial’, ou seja, a criação de uma linguagem para podermos falar sobre esse tema sem gerar conflito e favorecendo a compreensão”, analisa o docente.
Ele aponta que essa lacuna, é muitas vezes, deixada pelas instituições de ensino, que não abordam o tema durante a formação dos profissionais. Mas ressalta o protagonismo do Conselho Federal de Psicologia (CFP) e do Sistema Conselhos de Psicologia nessa discussão, com ações como a publicação da Resolução 18/2002, que determina normas de atuação das (os) profissionais em relação ao preconceito e a discriminação racial.
“Os Conselhos de Medicina e Enfermagem, por exemplo, não têm nenhuma resolução que trate desse tema”, compara. “No que se trata de orientação, o Sistema Conselhos está oferecendo uma verdadeira formação de temas que seriam interessantes para a universidade trabalhar. A Psicologia Social no Brasil se funda no estudo das relações étnico-raciais, isso está na história.”
Visibilidade
A presidente do CRP-01 – DF, Vanuza Sales, lembrou a importância do minicurso como forma de dar visibilidade à Resolução e debater os efeitos do racismo, além de ser uma ação que está sendo seguida por outros Conselhos Regionais (CRs).
“Queremos possibilitar aos profissionais que eles estejam instrumentalizados para o cotidiano do seu trabalho, para quando receberem essas demandas saberem como lidar com elas”, explica.
No dia a dia, a psicóloga Agnes Rodrigues de Oliveira, do Distrito Federal, conta que já viveu os dois lados do racismo. O preconceito sofrido por ela, por parte dos pacientes, e também ao ouvir relatos de pacientes que foram vítimas de discriminação racial.
“Por eu ser negra, acredito que tenho uma maior facilidade de criar uma empatia com o paciente para identificar esse problema. Mas o discurso no Brasil é de que o racismo não existe, e em grande parte é um discurso de quem não vive esse problema. Para sensibilizar essas pessoas, precisamos fazer o debate das questões raciais, não somente de nós para nós, mas com toda a sociedade”, pontua.
Perfil
A Anpsinep no DF trabalha desde sua criação, em setembro, para finalizar um levantamento das (os) psicólogas (os) que atuam no Distrito Federal. O coordenador do Núcleo, Igo Gabriel Ribeiro, diz que o estudo local auxiliará a suprir essa lacuna deixada pelos currículos nas universidades.
Levantamento feito pelo CFP em parceria com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), divulgado em agosto de 2016, mostra que 16,05% das (os) psicólogas (os) no Brasil são negras (os).