O Conselho Federal de Psicologia (CFP) vai se reunir com o Ministério Público do Trabalho (MPT) para dialogar sobre o papel do profissional da Psicologia no diagnóstico em saúde mental no contexto laboral.
O objetivo do encontro é apresentar ao procurador-geral do Ministério Público do Trabalho, José de Lima Ramos Pereira, uma compreensão mais profunda sobre a atuação de psicólogas e psicólogos no diagnóstico de saúde mental relacionado ao ambiente de trabalho, além de estreitar o diálogo com o MPT.
O presidente do CFP, Pedro Paulo Bicalho, destaca a importância de elucidar que a prática da Psicologia no diagnóstico de saúde mental é respaldada por normativas legais e científicas que delimitam as competências e os conhecimentos dessas(es) profissionais. “A Psicologia, como ciência e profissão, desempenha um papel essencial no entendimento dos aspectos comportamentais e mentais humanos, inclusive no âmbito laboral”, explica Pedro Bicalho.
A proposta é disponibilizar ao Ministério Público do Trabalho informações detalhadas sobre a formação,a regulamentação e a prática das (os) psicólogas (os) no diagnóstico de saúde mental, além de explicitar como essa abordagem integra as diretrizes estabelecidas pelas legislações pertinentes.
A solicitação de reunião com o procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho vem após recente manifestação da procuradora do MPT na 5ª Região Rosangela Rodrigues Dias de Lacerda, que em um programa de rádio levantou questionamentos quanto à atuação de profissionais da Psicologia no diagnóstico de questões de saúde mental no contexto laboral.
Nota pública
Além do pedido de reunião com a instância máxima do Ministério Público do Trabalho, o Conselho Federal de Psicologia também divulgou uma nota pública em repúdio às declarações da procuradora do MPT. No documento, o Conselho destaca que a realização de avaliações psicológicas para identificar e diagnosticar condições de saúde e adoecimento mental consta dentre as atividades das(os) psicólogas(os).
“O diagnóstico de problemas de saúde mental pode requerer abordagem pluridisciplinar, demandando ofícios de outros(as) profissionais. Nesse âmbito, as(os) psicólogas(os) são devidamente qualificadas(os) e treinadas(os) para realizar avaliações diagnósticas”, diz o CFP na nota, que condena todo e qualquer ato que desconsidere fundamentos científicos e jurídicos relacionados à prática profissional da Psicologia.
A avaliação do psicólogo Bruno Chapadeiro, integrante do GT ‘Trabalho, Gestão e Saúde Psicossocial’ do CFP, é que essa aproximação com o MPT deve mostrar o quanto a Psicologia pode ser parceira nas ações relacionadas à saúde mental nos ambientes de trabalho.
“A Psicologia tem muito o que somar nestas questões envolvendo saúde mental e trabalho, inclusive, com a capacidade para realizar ações conjuntas com o MPT, uma vez que a saúde do trabalhador é eminentemente multiprofissional, intersetorial e interdisciplinar”, aponta.
Veja a íntegra da nota
NOTA SOBRE DIAGNÓSTICO DE SAÚDE MENTAL NO CONTEXTO LABORAL
O Conselho Federal de Psicologia (CFP) tomou conhecimento de manifestação da procuradora do Ministério Público do Trabalho da 5ª Região (MPT), Rosangela Rodrigues Dias de Lacerda (matrícula 659), em entrevista ao programa “Metrópole Serviço” da Rádio Metrópole, segundo a qual mencionou que psicólogas(os) não estariam aptas(os) a diagnosticarem adoecimentos mentais relacionados ao trabalho.
A Psicologia, enquanto ciência e profissão, tem como objetivo diagnosticar, compreender e explicar o comportamento humano e os processos mentais superiores, nos diversos contextos de funcionamento psicossocial, abarcando processos de desenvolvimento saudável e o adoecimento. A regulamentação da profissão de psicólogo(a) no país data de 1962 (Lei n.º 4.119, de 27 de agosto de 1962). Desde seus primórdios, o exercício do psicodiagnóstico, com especial relevo para o uso de testes psicológicos, marcou o nascimento da profissão no Brasil, abarcando quatro atividades listadas na Lei supracitada, quais sejam: o psicodiagnóstico; a orientação e seleção profissional; a orientação psicopedagógica e a solução de problemas de ajustamento. Vale salientar que essas atividades foram caracterizadas pela lei regulamentadora como prerrogativa exclusiva do profissional da Psicologia. Em conjunto com outras técnicas, como a anamnese, por exemplo, esses instrumentos contribuem para o diagnóstico dos transtornos mentais e comportamentais.
Nesse mesmo contexto, a Resolução CFP n° 31, de 15 de dezembro de 2022, estabelece que a avaliação psicológica “é um processo estruturado de investigação de fenômenos psicológicos, composto de métodos, técnicas e instrumentos, com o objetivo de prover informações à tomada de decisão, no âmbito individual, grupal ou institucional, com base em demandas, condições e finalidades específicas” (Art. 1º, §1º). Além disso, a Resolução n.º 218, de 6 de março de 1997, do Conselho Nacional da Saúde, reconhece os profissionais de Psicologia como profissionais de saúde de nível superior. Mais especificamente em relação ao contexto do trabalho, a Resolução do Conselho Federal de Psicologia n° 14, de 28 de junho de 2023, regulamenta o exercício da(o) profissional psicóloga(o) na avaliação de riscos psicossociais relacionados ao trabalho, no âmbito das Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho e Previdência.
A avaliação psicológica é uma das áreas de especialidade da psicologia. Em sua formação, as(os) psicólogas(os) adquirem as habilidades e o conhecimento necessários para conduzir entrevistas, aplicar testes psicológicos e interpretar resultados, permitindo-lhes avaliar e diagnosticar problemas de saúde mental, dentre outros diagnósticos.
A Psicologia é uma área que produz e se baseia em pesquisas científicas rigorosas para avançar em sua compreensão dos transtornos mentais e técnicas de diagnóstico. Prova disso é que a vasta literatura acadêmica sobre diagnóstico de transtornos mentais é predominantemente originária de pesquisadores(as) da área de psicologia. Essa produção de conhecimento contempla uma variedade de instrumentos de avaliação psicológica com evidências de validade e confiabilidade. As(os) psicólogas(os) se dedicam a pesquisar influências culturais e sociais no diagnóstico de saúde mental, destacando a importância de considerar diversas perspectivas, bem como experiências individuais e grupais relacionadas a estes fenômenos. A ciência psicológica está em constante evolução e o trabalho dedicado de muitos(as) pesquisadores(as), tanto da ciência básica quanto aplicada, contribui para a a maior compreensão do diagnóstico e da eficácia dos tratamentos em saúde mental.
Além de a formação em Psicologia promover uma abordagem baseada em evidências, as(os) psicólogas(os) também costumam ter experiência com pacientes que apresentam transtornos mentais em diversos contextos, incluindo o ambiente de trabalho. A produção de conhecimento das(os) psicólogas(os) associada à experiência prática, permite que tal categoria profissional apresente habilidades sólidas na avaliação e identificação de sintomas, padrões de comportamento e características associadas a diferentes transtornos mentais.
Nesse sentido, dentre as atividades das(os) psicólogas(os) está a realização de avaliações psicológicas para identificar e diagnosticar condições de saúde e adoecimento mental. O diagnóstico de problemas de saúde mental pode requerer abordagem pluridisciplinar, demandando ofícios de outros(as) profissionais. Nesse âmbito, as(os) psicólogas(os) são devidamente qualificadas(os) e treinadas(os) para realizar avaliações diagnósticas. As funções das(os) psicólogas(os) podem e devem se coadunar, no campo do diagnóstico de saúde mental, às contribuições de outras ciências. Estes profissionais podem trabalhar juntos, ou de forma independente, para fornecer avaliações precisas e planos de tratamento para pessoas com queixas ou transtornos de saúde mental. A escolha de qual profissional consultar para obter um diagnóstico dependerá das circunstâncias e preferências específicas da pessoa ou instituição que solicitar ajuda.
Neste contexto, o CFP vem, por meio desta nota, explicitar que não se coaduna com todo e qualquer ato que desconsidere fundamentos científicos e jurídicos relacionados à prática profissional da Psicologia em nosso país. A gravidade e complexidade dos problemas nos domínios da saúde mental, em suas diversas manifestações, convocam a sinergia de ações multiprofissionais, em lugar de disputas excludentes e contraproducentes.