Revista Psicologia Ciência e Profissão (PCP) publica primeiros artigos em 2023

Já estão disponíveis na plataforma da SciELO os três primeiros artigos de 2023 da Revista Psicologia: Ciência e Profissão (PCP). 

Como característica de um periódico que aborda vários temas da Psicologia, os três primeiros artigos de 2023 da PCP tratam de questões diversas: Relações Raciais; Psicologia Escolar; e Psicologia do Organizacional e do Trabalho.

O artigo “A Subtração da Vida como Política de Morte: Vozes de Mães de Jovens Negros Assassinados”, de autoria das pesquisadoras Vivane Martins Cunha (UFMG) e Lisandra Espíndula Moreira (UFMG),  reconstroi, por meio de vozes de mães de jovens negros mortos em ações policiais, a subtração da vida de seus filhos em contínuas políticas de precarização de suas existências.

O texto “A Expressão da Subjetividade na Atuação em Psicologia Escolar”, escrito pelas psicólogas Francisca Bonfim e Maristela Rossato (ambas da UnB), analisa como a constituição subjetiva do psicólogo se expressa em sua atuação no contexto escolar.

Já o artigo “Correr Atrás do Vento: O Trabalho dos Mototaxistas de Sobral, Ceará” analisa a atividade e o ofício dos mototaxistas da cidade de Sobral, no Ceará, bem como busca compreender a atividade exercida e o conceito de real da atividade; as prescrições; as regras informais; e as relações profissionais. O texto é de autoria dos seguintes pesquisadores da Universidade Federal do Ceará: Ismênia Ariel Magalhães Feijão Pontes, Francisco Pablo Huascar Aragão Pinheiro, Nayana Rios Nunes da Silva, Natacha Oliveira Júlio, Cássio Adriano Braz de Aquino e Renata Guimarães de Carvalho.

A previsão é de que, até o final deste semestre, outros 47 textos sejam publicados pela Revista Psicologia: Ciência e Profissão. Em 2022, a PCP publicou um total de 95 artigos entre os quais, uma produção especial sobre os 60 anos da regulamentação da Psicologia no Brasil. Além de 15 artigos para a edição especial, o periódico reuniu textos sobre temas como  Relações Raciais, Psicologia Política, Relatos de Experiência, Psicologia na Assistência Social, Psicologia Clínica e Avaliação Psicológica.

Sobre a PCP

Editada desde 1979 pelo Conselho Federal de Psicologia, a Revista Psicologia: Ciência e Profissão é uma publicação científica de excelência internacional, classificada com a nota A2 no sistema Qualis de avaliação de periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) do Ministério da Educação.

A criação da Revista PCP se deu no ano das comemorações do centenário do laboratório de Wundt, na Alemanha – instituído oficialmente em 1879 e considerado o marco da Psicologia como saber científico. 

É nesta perspectiva de ciência enquanto ação política, que a PCP reúne artigos originais referentes à atuação profissional da(o) psicóloga(o), à pesquisa, ao ensino ou à reflexão crítica sobre a produção de conhecimento na área da Psicologia. Sua principal missão é contribuir para a formação profissional da(o) psicóloga(o) brasileira(o), bem como socializar o conhecimento produzido por aqueles que pesquisam e/ou atuam na área. 

Atualmente, a revista está indexada nas bases da SciELO; Lilacs (Bireme); Clase; Latinex; PsycINFO; Redalyc; Psicodoc e Google Scholar.

Saiba mais:

Leia os primeiros artigos de 2023 publicados pela revista PCP 

Leia os artigos de 2022 publicados pela revista PCP 

Saiba como publicar na revista PCP 

Leia toda a produção da PCP desde 1979

CFP institui o prêmio profissional Sylvia Leser de Mello: Práticas Inovadoras no Exercício da Psicologia

O Conselho Federal de Psicologia (CFP) publicou na sexta-feira (16) a Resolução Nº 32, de 15 de dezembro de 2022, que institui o prêmio profissional Sylvia Leser de Mello: Práticas Inovadoras no Exercício da Psicologia. O anúncio foi feito durante a Assembleia de Políticas, da Administração e das Finanças (APAF), que aconteceu até sábado (17), em Brasília.

A resolução institucionaliza e estabelece a periodicidade anual do prêmio profissional sobre práticas inovadoras lançado em 2022 pelo CFP e que contou com a inscrição de mais de 160 trabalhos, revelando a importância das práticas inovadoras para a Psicologia e para o conjunto da sociedade.

O objetivo do prêmio é identificar, valorizar e divulgar estudos e experiências de psicólogas(os) que se caracterizem como avanços em termos de produção de conhecimento nos diversos campos da Psicologia. Também está entre os objetivos fomentar a pesquisa e o desenvolvimento de modelos, procedimentos e técnicas envolvidos na atuação profissional que possam indicar caminhos para o aprofundamento da construção de conhecimento científico inovador e do compromisso social da Psicologia.

Os trabalhos teórico-técnicos devem estar relacionados a três categorias de práticas profissionais:

Experiências ou produtos derivados do trabalho profissional individual ou coletivo da(o) psicóloga(o);

Experiências ou produtos derivados de trabalhos realizados em cursos de especialização ou de mestrado;

Experiências ou produtos derivados de trabalhos realizados em cursos de doutorado, pós-doutorado, bem como de projetos de pesquisa vinculados a grupos de pesquisa.

Os trabalhos premiados nas três categorias, assim como outras práticas de elevado mérito inovador, mesmo que não premiados, deverão integrar uma publicação do Conselho Federal de Psicologia cujo objetivo é a difusão das práticas inovadoras nas comunidades científicas e profissionais da Psicologia.

Sylvia Leser de Mello

Sylvia Leser de Mello foi uma intelectual e docente que dedicou grande parte de sua vida e obra ao desenvolvimento da Psicologia Social. A pesquisadora, que faleceu em 3 de janeiro de 2021, foi professora do Departamento de Psicologia Social (PST) do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP), promovendo a intersecção entre filosofia, literatura e a Psicologia. Entre suas linhas de estudo estão a Interação Social, O Homem no Trabalho e a Economia Solidária.

Na USP, a docente foi fundadora do Laboratório de Estudos da Família, Relações de Gênero e Sexualidade (LEFAM), em 1993; criadora da Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares (ITCP), em 1998; e a fundadora do Núcleo de Economia Solidária (NESOL).
Em 2011, a Revista Ciência e Profissão, editada pelo Conselho Federal de Psicologia, publicou artigo em homenagem à Sylvia Leser. Em 2003, recebeu do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo (CRP-06/SsP) o reconhecimento por seu compromisso social com a Psicologia no Brasil.

Em sua trajetória pessoal e profissional, Sylvia Leser inspirou com sua coragem, sensibilidade e sua incansável luta pelos direitos humanos e pelo desenvolvimento de uma Psicologia crítica e com comprometimento político e social.

V CBP: o grande encontro entre a ciência e a profissão

Entre os dias 14 e 18 de novembro, ocorreu o V Congresso Brasileiro Psicologia: Ciência e Profissão. Com mais de 14 mil inscritos, de todos os estados do país, e 5 mil trabalhos apresentados, este foi o maior congresso da história da Psicologia brasileira, mostrando uma Psicologia diversa, plural e unida.

Para o presidente do Conselho Federal de Psicologia (CFP) e secretário executivo do Fórum de Entidades Nacionais da Psicologia Brasileira (Fenpb), Rogério Giannini, o CBP já era um congressão e passou agora ao status de “congressaço”, “sendo um espaço de encontros, em que a ciência encontra a profissão e em que a ciência e profissão encontram a sociedade brasileira”.

O coordenador do V CBP e conselheiro do CFP, Fabián Rueda, afirmou que esta 5ª edição contou com o maior envolvimento da história do CBP por parte das 26 entidades quem compõem o Fenpb. “Todas arregaçaram as mangas e o produto final de 21 meses de preparação é o maior congresso da história da Psicologia brasileira”.

“O V CBP deixa em evidência a união da Psicologia brasileira. A Psicologia brasileira está dando o seu recado: nós somos muitas e muitos, diversas e diversos, somos plurais. A Psicologia brasileira está unida e dialogando com todas e todos que querem pensar uma Psicologia que promova a igualdade, o respeito e a defesa dos direitos humanos como condições inegociáveis”, declarou.

No encerramento, na noite do domingo (18), foram distribuídas rosas aos participantes. E, inspirado na já tradicional escultura humana formada pelos participantes do encontro – que nesta edição compôs a imagem intitulada “a rede”-, Fabián Rueda convidou a todas e todos presentes no auditório a unirem as mãos, como símbolo do quanto a categoria precisa estar junto para defender a Psicologia. “Com paz, união e diálogo, toda Psicologia nos interessa. Assim, nos encontraremos em 2022 no VI CBP e, até lá, ninguém vai soltar a mão de ninguém”, finalizou Rueda.

O V CBP

Durante o encontro, ocorreram diversas atividades como rodas de conversa “conversando sobre”, “mesas redondas”, “simpósios ciência e profissão” e “simpósios magnos”, “conferências”, “oficinas” “como eu faço”, os “Diálogos Impertinentes”, os “Diálogos Latino-Americanos”, as comunicações orais, e também a apresentação de pôsteres.

Vários espaços puderam ser percorridos durante a realização do congresso, como o estande do Fórum de Entidades Nacionais da Psicologia Brasileira (Fenpb) – no qual o CFP esteve presente ativamente, distribuindo material produzido pelo Sistema Conselhos de Psicologia para a categoria –, além de espaços temáticos, como o “Espaço do Brincar”, o espaço sobre Relações Raciais, o “CORAge”, e os espaços “Corpo”, “PAZ” e “Bebê”.

O evento também foi a oportunidade para a realização de reuniões organizativas de associações, entidades e estudantes de Psicologia. Além disso, foram lançadas publicações do CFP, como a edição especial da Revista Ciência e Profissão, sobre os 15 anos do Sistema de Avaliação de Testes Psicológicos (SATEPSI) e o livro Referências técnicas para atuação de psicólogas(os) em Políticas Públicas de mobilidade humana e trânsito. O CFP também certificou os ganhadores do “Prêmio Profissional: Avaliação Psicológica e Inclusão”.

V CBP nas redes

O V CBP também esteve presente nas redes sociais. O Conselho Federal de Psicologia garantiu a transmissão ao vivo das principais mesas, alcançando mais de 179 mil pessoas apenas pelo Facebook do CFP. Já as postagens no Instagram foram visualizadas por 73 mil pessoas, com 10 mil curtidas ao total.

Ciência e Profissão sobre sistema prisional e segurança pública

Revista “Psicologia: Ciência e Profissão” (PCP) lançará edição especial em 2018 sobre Psicologia, sistema prisional e segurança pública. O número, aprovado pelo XVII Plenário do Conselho Federal de Psicologia (CFP), busca fomentar a produção do conhecimento, a reflexão sobre as práticas profissionais, as políticas e outras intervenções possíveis no contexto do sistema prisional e da segurança pública.

Serão publicados ensaios teóricos e relatos de pesquisa de profissionais relacionados a questões ético-políticas da área.

A revista é publicada trimestralmente pelo Sistema Conselhos de Psicologia na Plataforma SciELO.

As pessoas interessadas em participar devem enviar os artigos, até 31 de julho, para numeroespecial@cfp.org.br. Os artigos, avaliados segundo as normas editoriais da revista, serão editados pelos professores Pedro Paulo Bicalho, Anna Paula Uziel, Andreia Scisleski e João Paulo Barros.

Para o conselheiro Pedro Paulo Bicalho, o número especial afirma o compromisso da revista com os desafios que se apresentam no atual cenário político do país e que envolvem a construção teórica dos saberes psicológicos na interface com as políticas públicas e o modo como a profissão tem se efetivado junto às demandas da população brasileira. “Organizar este número temático é compromisso urgente de posicionamento que a Psicologia deve efetivar.”

Psicologia e Democracia

Em 2017, o CFP publicou uma edição especial intitulada: “Psicologia e democracia”. A edição ampliou a visibilidade para os artigos vencedores do “Prêmio de Psicologia e Direitos Humanos: ditadura civil-militar e repercussão sobre a Psicologia como ciência e profissão”, promovido em dezembro de 2013. O concurso, que recebeu 52 artigos, buscou estimular análises sobre o regime autocrático e as possíveis implicações sobre a Psicologia.

Este ano, já foram publicadas duas edições regulares da “Psicologia: Ciência e Profissão”. Além da edição especial, mais duas edições regulares e uma especial, sobre avaliação psicológica, os 15 anos do Sistema de Avaliação Psicológica (Satepsi), estão previstas para 2018.

Conheça a revista Psicologia: Ciência e Profissão

Leia a edição 38.1

Leia a edição 38.2

Leia a edição especial Psicologia e Democracia.

Revista Ciência e Profissão: Nova edição está disponível para leitura

A Revista Psicologia, Ciência e Profissão (PCP), edição 38.2, já está disponível na plataforma SciELO. Em breve, o periódico chegará às bibliotecas das universidades e faculdades de Psicologia de todo o Brasil. O compromisso da PCP é promover diálogos entre prática profissional, formação e pesquisa, de forma a contribuir para a produção de conhecimento em Psicologia e para o enfrentamento dos desafios impostos pela conjuntura política e econômica do país.

Nesta publicação, a editora da revista, Neuza Guareschi, explica no texto “Formação em Psicologia, Práticas Profissionais e Produção de Saberes” que 12, dos 14 artigos publicados nesta edição são relacionados ao tema da formação em Psicologia e da instrumentalização de técnicas e metodologias utilizadas nessa área, seja no campo das práticas profissionais ou no da produção de saberes. Segundo Guareschi, a intenção em abordar a formação com uma aproximação entre a Psicologia como campo de práticas profissionais e de produções de saberes é para pensar seus modos de se constituir como uma possibilidade de conhecimento para analisar as realidades nos diferentes contextos da sociedade em que está implicada.

Excelência – Editada desde 1979, a “Psicologia: Ciência e Profissão” é uma publicação científica de excelência internacional, classificada com a nota A2 no sistema Qualis de avaliação de periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) do Ministério da Educação. Atualmente, a revista está indexada nas bases da SciELO; Lilacs (Bireme); Clase; Latinex; PsycINFO; Redalyc; e Psicodoc.

Confira a edição 38.2 

Leia o editorial “Formação em Psicologia, Práticas Profissionais e Produção de Saberes”

Leia todas as edições da Revista Psicologia: Ciência e Profissão

Impactos do terremoto de 2010 em imigrantes haitianos

Quais os impactos psicológicos que um terremoto de grandes proporções causa na vida das pessoas? Por que emigram para outro país, após a tragédia? Essas indagações estão presentes no artigo “Reconstrução em movimento: impactos do terremoto de 2010 em imigrantes haitianos”, publicado na edição 38.1 da revista Psicologia: Ciência e Profissão.

O texto é de autoria das pesquisadoras Allyne Fernandes Oliveira Barros e Lucienne Martins-Borges, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

O CFP publica artigos da revista no site e nas redes sociais – a versão eletrônica da Psicologia: Ciência e Profissão está na SciELO – para disseminar o conhecimento científico para a categoria e a sociedade.

Impactos – Segundo as autoras, a dificuldade do país em responder ao ocorrido, que agravou a situação precária da maioria de sua população, levou muitos haitianos a emigrarem, principalmente para o Brasil. O processo migratório, principalmente nas migrações involuntárias, implica diversas mudanças e pode levar o sujeito a um estado de vulnerabilidade psíquica, pois muito daquilo que o orientava em sua existência é ameaçado pelo contato com diferentes culturas.

As pesquisadoras esclarecem que o objetivo do artigo foi analisar quais os impactos psicológicos do terremoto, que, além de levar a experiência do imprevisível, foi seguido de uma migração necessária para a continuidade e a reconstrução da vida. Os resultados demonstram que a lembrança traumática, as perdas de pessoas próximas, da casa, do trabalho e da educação foram acrescidas às dificuldades de uma migração que, apesar de facilitada legalmente, é vivida com dificuldade de integração pela maioria desses sujeitos. Em contrapartida, o desejo de reconstrução da história individual e coletiva se apresenta como importante força na vida dessas pessoas, que, mesmo a distância, procuram compartilhar projetos com os conterrâneos.

Allyne Barros, uma das autoras do artigo, explica mais detalhes da pesquisa.

Entrevista – Qual a proposta da pesquisa?

A imigração é tema de trabalho e inquietações em nossa trajetória profissional há algum tempo. Desde 2012, escutamos imigrantes e refugiados de diversas nacionalidades na Clínica Intercultural, um projeto de extensão universitária da Universidade Federal de Santa Catarina em Florianópolis. Esse projeto, cuja proposta é oferecer atendimento psicológico a sujeitos deslocados de seus países de origem por diversas razões, se inspira em um trabalho ainda mais antigo e consolidado: a experiência do Service d’aide Psychologique aux Imigrants e Refugiés (Sapsir), de Québec, no Canadá. Fundado pelos professores Jean-Bernard Pocreau e Lucienne Martins Borges, em 2000, o Sapsir integra a rede pública de saúde e assistência social da cidade. Quando Lucienne se torna professora na UFSC, passa a se questionar sobre os imigrantes e refugiados que residem em Florianópolis.

Migrar não é uma novidade para haitianos; mas migrar após um desastre natural que enuncia e denuncia mais uma etapa da catástrofe social da história do Haiti e, ainda, se deslocar para um país que não compunha o destino final desses sujeitos outrora, nos chamou atenção. Era inegável que a ocorrência do terremoto teve impactos em suas vidas, mas não era claro que tipo de desdobramentos psicológicos essa vivência tinha, ainda mais alguns anos depois. Essa dúvida, intensificada pelo cotidiano clínico no projeto de extensão, motivou a tomar este tema o de minha pesquisa de mestrado, orientado pela professora. Lucienne.

Quais os resultados do levantamento?

O primeiro, e talvez menos inédito, é que a ideia de desastre natural está cada vez mais em desuso. Enquanto terminologia, é útil para a busca de estudos que investigam fenômenos da natureza que ocorrem “independentemente” da ação humana em sua origem. No entanto, os impactos desses fenômenos e a qualificação de desastre estarão sempre associados ao impacto em sujeitos e grupos. Nesse ponto, podemos considerar tanto os impactos objetivos quanto subjetivos. Estes impactos estão engendrados em um panorama histórico, político, social e cultural. Por isso, um terremoto que ocorre no Haiti tem desdobramentos absolutamente diferentes do que um terremoto da mesma magnitude que ocorra em um outra lugar. Forçar um contingente significativo de sujeitos a migrar, alterar os destinos dessa rota e apostar na migração enquanto solução singular e coletiva foram características daquele terremoto de 2010 ocorrido no Haiti. Trata-se de um país que historicamente sedia eventos catastróficos no que concerne aos efeitos e não por características “intrínsecas” ao espaço geográfico, por exemplo, como a disposição das placas tectônicas. O ponto central é sua disposição no espaço geopolítico, que necessita do “tremor” de uns para a “estabilidade” de outros. A aposta na escuta das narrativas dos próprios sujeitos frente ao que lhes ocorreu os situa em uma outra posição no campo discursivo e, portanto, no campo social. Assim, percebeu-se a partir das entrevistas que as estratégias de sobrevivência psíquica frente a eventos extremos se constroem coletivamente, ainda que no plano singular os caminhos variem. Em outras palavras, percebeu-se que as bases estruturais da formação subjetiva, engendradas na cultura compartilhada entre aqueles sujeitos, foi fundamental para a continuidade da vida. O terremoto não atingiu a aposta desses sujeitos em viver juntos, não virou assunto do qual não se podia falar. Diferente das violências decorrentes da violação mais direta de outro sujeito humano, presente nos crimes de lesa humanidade, a ocorrência desse fenômeno implicou em solidariedade mútua frente ao desamparo político e social, contribuindo para a construção de narrativas que apontaram para construções futuras.

Como usar a experiência da Psicologia no Haiti para pessoas que passam por desastres naturais e humanitários?

Em primeiro lugar, é fundamental destacar que não se tratou de um trabalho de Psicologia no Haiti, mas de um trabalho de pesquisa em Psicologia com sujeitos naturais do Haiti que se encontravam no Brasil na condição de imigrantes após a ocorrência do terremoto de 2010. Compreendemos que não há experiência transponível, pois isso implicaria desconsiderar o seu tempo, contexto e aspectos culturais dos sujeitos envolvidos em desastres naturais e humanitários.

Talvez possamos começar justamente por essas características para afirmar que os resultados da pesquisa apontam para a importância de criação de espaços de escuta dos sujeitos afetados por esses eventos. Não nos referimos aqui à exclusividade da psicoterapia, mas sim de um cuidado em busca de promoção de espaços de acolhimento que não gerem mais rupturas, separações e perdas. A impossibilidade imediata de soluções frente a eventos de caráter traumático muitas vezes remete à condição humana de desamparo, ou seja, faz lembrar de maneira radical que não se pode escapar do mal-estar. Portanto, o sentido do trabalho inicial é o de, junto à oferta de condições que garantam a vida em seu caráter mais elementar, trabalhar no sentido do resgate daquilo que constitui o sujeito: na presença de um outro sensível à sua condição, à sua diferença, a seus limites e suas forças. Não há receita, mas pode-se dizer que algumas propostas iniciais se situam no reconhecimento do que fez nascer aquela comunidade atingida e não no aniquilamento de sua história.

Leia o artigo “Reconstrução em movimento: impactos do terremoto de 2010 em imigrantes haitianos” na íntegra.

Artigo analisa processos éticos publicados no Jornal do Federal

Qual a importância do Sistema Conselhos de Psicologia – Conselho Federal de Psicologia e Conselhos Regionais de Psicologia (CFP e CRPs) – nas tentativas de zelar e cumprir integralmente as práticas éticas da profissão. Essas foram as questões que envolveram a análise de processos éticos julgados pelos CRPs e CFP publicadas no artigo “Análise dos processos éticos publicados no jornal do Conselho Federal de Psicologia”.

O texto, publicado na edição 38.1 da Revista Psicologia: Ciência e Profissão, é de autoria das pesquisadoras Priscila ZaiaKarina da Silva Oliveira e Tatiana de Cássia Nakano, da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC–Campinas).

O CFP publica artigos da revista no site e nas redes sociais – a versão eletrônica da Psicologia: Ciência e Profissão está na SciELO – para disseminar o conhecimento científico para a categoria e a sociedade.

Processos éticos

 A pesquisa, que abrangeu 26 edições do “Jornal do Federal”, apresentou 286 infrações na seção intitulada “Processos Éticos”. Os resultados apontaram que a região 8, referente ao Paraná, demonstrou maior incidência de processos éticos por psicólogos inscritos. Quanto ao conteúdo das ementas, identificaram-se 35 categorias diferentes, sendo a mais comum sobre processos éticos profissionais.

As pesquisadoras destacam que os três números mais recentes da revista, na época da redação do artigo, apresentaram com maior clareza o conteúdo das ementas, tornando possível verificar que dos 57 processos éticos descritos, 34 foram relacionados à área da avaliação psicológica, representando 60% do total dos respectivos números.

O último dado analisado mostrou a decisão dos Conselhos Regionais e do Conselho Federal de Psicologia, sendo a mais comum para ambos o arquivamento dos processos. Elas concluíram que há uma demanda de ações voltadas à formação e à prática de profissionais da Psicologia, em especial da área de avaliação psicológica.

Em entrevista, as autoras contaram mais detalhes da pesquisa.

 

O que as motivou a pesquisar o tema?

O programa de pós-graduação em Psicologia da PUC-Campinas tem, dentre suas ações de interação entre os alunos da pós-graduação e graduação, o estágio em docência. Tal estágio é uma oportunidade de desenvolvimento de habilidades relacionadas à pratica do ensino, promovendo o diálogo entre os alunos dos diferentes programas. Durante sua realização, uma das autoras, ao refletir com os alunos da graduação sobre as implicações éticas da prática em Psicologia, em especial, as ações que envolvem a avaliação psicológica, notou a ausência de informações que contribuíssem para a compreensão do cenário geral relacionado aos problemas éticos. Ao refletir sobre esta lacuna junto ao grupo de pesquisa, no qual está inserida, o tema foi acolhido e em seguida, deu-se início ao desenvolvimento da pesquisa publicada.

Junte-se a esse quadro o fato de que a área da avaliação psicológica tem se voltado, cada vez mais, à promoção de sua qualidade e retomada da sua credibilidade, tanto no meio acadêmico quanto social. Pensamos que, investigar as infrações éticas, traçando seu perfil e conhecendo melhor suas características, poderia auxiliar os estudantes e profissionais na discussão desse importante aspecto da profissão.

Quais os resultados do levantamento?

Em primeiro lugar, compreender que os resultados devem ser interpretados de acordo com os dados acessados pelas autoras, de modo que generalizações devem ser feitas com cautela. O número de processos éticos existentes provavelmente é bem maior do que aqueles considerados no artigo, devido à restrição de acesso a determinadas edições do “Jornal do Federal” e o número de denúncias que não chegaram a ser feitas, de modo a caracterizar uma subnotificação dos casos existentes.

Dentre os resultados identificados ao longo do levantamento, destacamos a importância de os dados serem interpretados a partir da prevalência de faltas éticas considerando a quantidade de profissionais inscritos, não apenas em cada região, mas também o total nacional. Tal cuidado foi tomado a fim evitar a afirmação de que determinadas regiões, por exemplo, apresentariam mais casos éticos do que outras. Se olharmos isoladamente os números de infrações, chegaremos a essa conclusão, que não é verdadeira. Por exemplo, a região 6, referente a São Paulo, apresenta o maior número de faltas éticas publicadas no “Jornal do Federal”. A maior prevalência de faltas cometidas, entretanto, se refere ao Paraná (CRP-8), se considerarmos a proporção de faltas éticas por profissional com CRP ativo. Tomando-se apenas os dados brutos, é possível que conclusões inadequadas sejam retiradas e, por isso, é fundamental que a leitura dos resultados seja feita de forma contextualizada.

Outro ponto importante a destacar se refere ao aparente alinhamento entre as instâncias regionais e federal, pois em 48,25% das ocorrências, o CFP endossa a decisão dos CRs, assegurando a convergência de ações desses órgãos e um trabalho conjunto de educação, fiscalização e punição aos casos cuja infração se confirma.

Por fim, é importante destacar os resultados relacionados às infrações éticas cometidas em relação a princípios da avaliação psicológica. Os resultados apontaram que 60% dos processos éticos listados nos três últimos números analisados, referiam-se a essa área. Entendendo que a avaliação psicológica é uma prática exclusiva de profissionais da Psicologia, é fundamental que as atuações relacionadas ao tema sejam realizadas com o máximo de cuidado e zelo, de forma a dirimir erros e manter a credibilidade da área.

Quais ações podem ser feitas para que profissionais da Psicologia não sejam submetidos a processos éticos no exercício da avaliação psicológica?

Entendemos que existem ações que devem ser realizadas em diferentes níveis. Considerando o nível profissional, é importante reconhecer que o processo de formação em Psicologia se caracteriza por ser uma ação que se estende ao longo de sua carreira, e que não está encerrado ao final da graduação. Deve buscar sempre uma qualificação continuada e atualizada, especialmente na avaliação psicológica.

No que se refere ao âmbito do ensino, acreditamos que é de grande importância que os cursos de formação ofereçam disciplinas e conteúdos voltados à ética, não só em relação aos seus aspectos teóricos e normativos, mas, também, exemplos de denúncias e infrações cometidas por profissionais, trâmites envolvendo processos e penalidades existentes. O conhecimento do Código de Ética Profissional também é essencial.

Tomando-se a área da avaliação psicológica, os profissionais devem ter em mente que a prática não se resume apenas à testagem, mas que é um processo amplo e complexo, que deve envolver diferentes métodos e ferramentas, dentro de uma avaliação ampliada do sujeito. A partir da combinação de aspectos teóricos e técnicos, o profissional certamente terá mais segurança na tomada de decisão nos diferentes contextos de atuação. Assim, é importante que os estudantes sejam esclarecidos e estimulados a desenvolverem suas habilidades técnicas e a aprofundarem seus conhecimentos, de modo a estarem aptos à complexidade da tarefa. Do mesmo modo, os profissionais precisam conhecer suas limitações e restrições, tanto em termos de conhecimento quanto em relação às áreas de atuação. Caso seja necessário, ele deve encaminhar o caso para outros profissionais especializados.

Outro âmbito a ser considerado se refere à questão social da Psicologia. Além da existência de um órgão regulamentador da profissão, o CFP e suas instâncias regionais, também cabe ao profissional zelar pela imagem de sua profissão, atuar de forma ética e responsável, fiscalizar e denunciar profissionais que desrespeitem esses princípios.

Leia a íntegra do artigo Análise dos Processos Éticos Publicados no Jornal do Conselho Federal de Psicologia.

Artigo trata da intervenção da Psicologia em universidade

Apresentar uma experiência profissional que faz uma avaliação crítica da intervenção em Psicologia em uma Instituição Federal de Ensino (IFE) na Amazônia Ocidental do Brasil. Essas e outras reflexões estão presentes no artigo “A Intervenção em Psicologia em uma Universidade na Amazônia Sul Ocidental”, redigido pela professora da Universidade Federal do Acre (UFAC) e ex-conselheira do CFP, Madge Porto. O artigo faz parte da edição 37.4 da revista Psicologia: Ciência e Profissão.

O Conselho Federal de Psicologia (CFP) publica artigos da revista no site e nas redes sociais – a versão eletrônica da Psicologia: Ciência e Profissão está na SciELO – para disseminar o conhecimento científico para a categoria e a sociedade.

De acordo com o artigo, a estratégia foi apresentar um projeto de trabalho no qual a ação principal seria a promoção à saúde, ao mesmo tempo que os relatórios das atividades desenvolvidas eram entregues sistematicamente, demonstrando a partir de resultados, como os níveis baixos de procura e níveis altos de evasão e de custo, que a proposta da gestão não seria a melhor estratégia.

A crítica da pesquisadora é de que atividades de promoção e prevenção em saúde, com trabalhos em grupo substancialmente, precisariam ser objetivo principal da intervenção em Psicologia em uma universidade. Segundo ela, uma política pública que quer intervir apenas nos sintomas e não nas causas destes apresenta-se como apoio ao desmonte das universidades públicas.

As ações propostas para cuidar da saúde dos servidores e servidoras e estudantes se tornam uma intervenção sem impacto significativo na instituição e que não contribuem para a afirmação da universidade gratuita, de qualidade, laica e socialmente referenciada, estando, assim, corroborando para o seu desmonte e, em curto prazo, possibilitar a privatização no lugar de efetivamente contribuir para a construção de uma educação de qualidade.

Em entrevista, Madge Porto conta mais detalhes do artigo:

O que a motivou a fazer a pesquisa sobre esse tema?

O que me motivou foi registrar uma experiência que se deu em um estado da Região Norte e que mostra a dificuldade de romper com modelos institucionais que se impõe mesmo depois de muitas tentativas de promover mudanças.

 

Quais os resultados que você destaca desse levantamento?

Gestores e gestoras da educação ainda pensando que o papel de psicólogas nas políticas de educação é “tratar” as alunas e alunos que têm “problemas”, como se não tivessem nenhuma responsabilidade e sem fazer nenhum tipo de auto-avaliação. Outra questão é a conduta de gestores e gestoras que chamam os profissionais especialistas, mas desconsideram os conhecimentos desses e impõem sua política.

Na sua opinião, quais tipos de contribuições a Psicologia pode dar para uma melhor qualidade da intervenção nas políticas públicas de educação superior?

A Psicologia tem uma importante contribuição nas políticas de educação superior em ações de promoção e prevenção em saúde mental de forma a oferecer possibilidades para que as e os estudantes possam cursar seus cursos da melhor forma por encontrarem apoio nos momentos difíceis como quando ingressantes ou concluintes ou em situações de conflito ou crise, de forma a não ter sua oportunidade de estudo limitada por qualquer tipo de sofrimento psíquico.

Leia na íntegra o artigo “A Intervenção em Psicologia em uma Universidade na Amazônia Sul Ocidental”

Edição 38.1 da Revista Psicologia: Ciência e Profissão está disponível

O primeiro número de 2018 da Revista Psicologia: Ciência e Profissão, edição 38.1, está disponível na plataforma SciELO e, em breve, chegará às bibliotecas das universidades e faculdades com cursos de Psicologia de todo o Brasil. O compromisso da PCP é promover diálogos entre prática profissional, formação e pesquisa, de forma a contribuir para a produção de conhecimento em Psicologia e para o enfrentamento dos desafios impostos pela conjuntura política e econômica do país.

Nesta publicação, a editora Neuza Guareschi aborda em seu texto “Ética, Política e Práticas Profissionais” que uma reflexão sobre ética, política e a prática profissional em Psicologia é extremamente oportuna e bastante associada à crise institucional pela qual passa o País. Ela destaca como exemplos o não respeito à diversidade, à diferença, ou de como a prática profissional precisa ser pensada para a alteridade e não para um seqüestro e tortura deste outro. Segundo ela, a decisão judicial sobre a Resolução no 001/1999 se encaixa nesse contexto.

Excelência

Editada desde 1979, a “Psicologia: Ciência e Profissão” é uma publicação científica de excelência internacional, classificada com a nota A2 no sistema Qualis de avaliação de periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) do Ministério da Educação. Atualmente, a revista está indexada nas bases da SciELO; Lilacs (Bireme); Clase; Latinex; PsycINFO; Redalyc; e Psicodoc.

Confira a edição 38.1.

Leia o editorial “Ética, Política e Práticas Profissionais”

Leia todas as edições da Revista Psicologia: Ciência e Profissão

 

Modos de ler em meios digitais: transformações da experiência

Como a mediação digital afeta a experiência de leitura das pessoas? O artigo “Modos de ler livros em meios digitais: transformações da experiência”, publicado na edição 37.3 da revista Psicologia: Ciência e Profissão, é resultado de pesquisa empírica realizada para investigar a leitura de livros digitalmente mediada. A autora do artigo é Luciana Dadico, doutora em Psicologia pela Universidade de São Paulo (USP).

O Conselho Federal de Psicologia (CFP) publica artigos da revista no site e nas redes sociais – a versão eletrônica da Psicologia: Ciência e Profissão está na SciELO – para disseminar o conhecimento científico para a categoria e a sociedade.

Na pesquisa, Dadico informa que a investigação partiu da hipótese de que a mediação digital afeta a experiência de ler, a despeito de se considerar a literatura uma arte alográfica. Foram entrevistados quatro leitores adultos, residentes no Estado de São Paulo, de forma semiaberta, gravada e sem uso de questionário. As entrevistas produziram imagens dos objetos em foco na pesquisa, a partir das quais foi investigada a percepção de tais objetos e as relações estabelecidas com eles pelos leitores.

A autora categorizou os modos como os leitores liam os livros na tela, permitindo individualizar padrões que participam da experiência de leitura: a leitura flutuante, a leitura frenética e a leitura eficiente, ancoradas em elementos específicos da obra e empreendidas por um leitor utilitarista e receoso de se aventurar em experiências novas. Ela considera que as tendências de leitura apontadas participam de e na estruturação de novas formas da experiência e da formação cultural do indivíduo na era digital.

Em entrevista, Luciana Dadico explicou mais detalhes de seu trabalho.

Entrevista

O que a motivou a pesquisar o tema?

Quando iniciei as pesquisas de meu doutorado, a digitalização dos textos, que já avançara em seu uso pessoal e nos meios jornalísticos, começava a ganhar também o mercado editorial. As revistas científicas vinham sendo progressivamente transferidas para os meios digitais, enquanto os livros (de literatura e didáticos) começavam a ser disponibilizados tanto na internet quanto em dispositivos de leitura, agora vendidos também pelas grandes redes de livraria.

Essas transformações geravam uma grande inquietação, uma vez que, como sabemos, a leitura de livros esteve tradicionalmente no centro não apenas das práticas educacionais, mas do próprio projeto burguês de formação do indivíduo. Esse fenômeno, que remonta ao Renascimento, gestou no Ocidente a ideia de que a livre circulação de livros, aliada à educação universal, seria responsável por conferir ao indivíduo maior liberdade de pensamento, um maior poder individual em relação à sociedade e às suas instituições. O indivíduo culturalmente formado seria mais capaz de se autodeterminar e de controlar melhor os rumos de sua existência. As ideias mesmas de indivíduo e de subjetividade surgem, em certo sentido, associadas à prática de ler livros que se consolidou na modernidade.

Mas se, como McLuhan e outros defendiam, “o meio é a mensagem” – quer dizer, o objeto mediador é diretamente responsável por ditar as características de sua recepção –, o que ocorreria então na passagem da leitura de livros para a leitura de obras em meios digitais? O modo como lemos seria afetado? Esta foi a pergunta que motivou as minhas pesquisas iniciais.

Para respondê-la, no entanto, era preciso descobrir primeiro como as pessoas liam livros em papel – coisa que, curiosamente, ninguém nunca tinha se perguntado em 500 anos história da imprensa. Talvez porque nunca ninguém tivesse antes pensado que a leitura e a escrita em papel estariam um dia sob julgamento. Por isso, minhas pesquisas do doutorado foram dedicadas, em primeiro lugar, ao estudo da leitura do livro em papel. Só depois, no pós-doutorado, passei ao estudo da leitura em meios digitais – agora em melhores condições de compreender e comparar as duas.

Como as pesquisas mostraram, é preciso considerar que nossa maneira de ler não é diretamente moldada pela forma do meio em que ela ocorre, em sentido causal e linear (como defendia McLuhan), embora a leitura seja, claro, afetada pelo meio. De maneira um tanto mais complexa, podemos dizer que nossos modos de ler se inserem em uma estrutura de experiência, transformada pelo uso dos meios digitais. Isso fez com que o foco de minhas pesquisas se ampliasse, passando a abarcar essa estrutura de experiência constituída na era digital – a qual inclui a experiência de ler livros, em papel e na tela.

Quais resultados você destaca em seu estudo?

Existe, como suspeitávamos, uma diferença grande nos modos de ler livros em papel e em meios digitais. De maneira geral, os resultados mostraram que a leitura de livros em meios digitais é mais veloz, mas há um prejuízo na qualidade dessa leitura.

Como e por que isto ocorre? Algumas características do dispositivo digital (como a luminosidade e o deslizar vertical do texto na tela) concorrem para uma apreensão mais superficial e veloz do texto, promovendo uma leitura flutuante e mesmo frenética. Nesse último caso, é como se o leitor “devorasse” o livro (mais do que ocorria no livro em papel), mas não estivesse disposto a perder muito tempo com ele, se demorando em descrições mais longas ou longos períodos reflexivos. Isso, em parte, porque a distração durante a leitura se dá de um modo diverso. O leitor que lê em papel tende a divagar ao se distrair da leitura: lembra coisas, associa imagens àquilo que está lendo, faz pausas para refletir.

O leitor que tem uma tela diante de si tende a voltar seus momentos de distração para o próprio aparelho e suas possibilidades de navegação: abre o email, o Twitter, o Facebook, consulta um dicionário, ouve uma música, então tende a empregar menos seus próprios recursos subjetivos para enriquecer sua experiência de leitura – que, consequentemente, se empobrece. O leitor pode até adquirir mais informações nessas novas formas de ler, mas não necessariamente tem uma melhor experiência de leitura.

A leitura flutuante, por sua vez, contribui para uma melhor apreensão das formas do texto, mas essa ocorre em função da superficialidade dessa leitura, de modo descolado dos conteúdos imanentes da obra, prejudicando a apreensão estrutural da obra pelo leitor. Por isso, denomino essa leitura formalista.

Considerando que, ao pensar em termos de uma estrutura de experiência, e não na relação imediata entre leitura e suporte do livro, é preciso destacar o fato de que também a leitura em papel acaba afetada pelos modos de ler constituídos em meio digital – assim como a própria leitura em meio digital é herdeira dos modos de ler que historicamente se constituíram no manuseio dos livros em papel. Ou seja: todos nós hoje lemos de maneira diferente, uma vez que estamos inevitavelmente inseridos em uma cultura digital.

Isso não significa, obviamente, que a aquele que lê em meio digital não consiga analisar um livro apenas porque ele foi digitalizado. Estamos falando de tendências. Uma coisa que causa preocupação, porém, é o fato de que, progressivamente, vai se aprofundando a cisão entre os leitores especializados (treinados para realizar uma análise imanente da obra literária) e o leitor comum, que progressivamente vai sendo desprovido de instrumentos para incrementar, por si mesmo, sua capacidade leitora – o que nos empurra em direção contrária às possibilidades de emancipação que um certo projeto de formação cultural associado à leitura de livros comportava.

É possível extrair uma porção de consequências objetivas e subjetivas desses fenômenos e, mais diretamente, dos novos modos de ler. Mas acho que os pontos que destaquei já dão ao leitor da revista uma boa ideia do que vem ocorrendo nessa passagem da leitura dos livros em papel para os meios digitais.

Leia o artigo de Luciana Dadico na íntegra.