CFP realiza encontro para debater ações relacionadas à saúde mental dos povos indígenas

O Conselho Federal de Psicologia (CFP) realizou no dia 8 de março um encontro com representantes do poder público e de organizações da sociedade civil para debater a saúde mental da população indígena no país. 

Além de propor estratégias de atuação na área, a atividade também colocou sob perspectiva a criação de um fórum permanente para reflexões sobre o assunto, bem como a possibilidade de organização de um seminário para tratar a fundo a temática.

Durante o evento, a conselheira Nita Tuxá, que também é uma das conselheiras de referência da Comissão de Direitos Humanos (CDH) da Autarquia, destacou as ações do CFP relacionadas à questão indígena, mencionando as Referências Técnicas Referências Técnicas para atuação de psicólogas(os) junto aos Povos Indígenas”  – material produzido no âmbito do Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas (CREPOP). 

Entretanto, a conselheira ponderou que a Psicologia brasileira ainda precisa avançar em relação ao acolhimento dessa população. “A gente está falando de profissionais que ainda não conhecem a nossa história. Não conhecem as nossas lutas, as violências que sofremos, o que a gente faz simplesmente para viver e existir”, reforçou.

Nita também frisou a importância de visibilizar a cultura e os saberes tradicionais, apresentando o movimento de jovens indígenas que utilizam-se de diferentes formas de expressão para revelarem suas dores e fragilidades associadas à saúde mental. A conselheira explicou ainda que o Conselho Federal vem potencializado esse debate e, entre os marcos, pontuou que, pela primeira vez na história do CFP, uma indígena psicóloga integra o plenário da Autarquia. 

Relatos de violências

Representantes das entidades presentes na reunião relataram casos de violência vivenciados por suas comunidades e familiares. O jornalista Anápuáka Tupinambá afirmou que seu filho, estudante de Psicologia, constantemente se vê obrigado a dialogar sobre sua própria identidade em movimento ao perceber atitudes racistas. “Fala-se do contraste entre os estigmas da identidade indígena, como se fosse harmoniosa, tranquila, equilibrada com a natureza, e a realidade concreta é de próprio sofrimento”, apontou. 

Kretã Kaingang, da ARPIN Sul/APIB, fez alusão aos professores e à troca de saberes dentro da comunidade. Ele também relatou sobre processos pessoais que tem vivido, como a relação de ser uma pessoa indígena no movimento e suas famílias no sentido de que passam mais tempo dedicados à luta do que em momentos com o círculo familiar. Partilhou ainda que esse lugar de destaque no movimento indígena o torna parecido com um “personagem”. Para ele, o falecimento de sua filha revelou o quanto é necessário dialogar com os jovens e ter profissionais para abordar a saúde mental. “Nossa população é bem menor que a população brasileira geral, mas os índices de suicídio são maiores. E, para nós, cada perda é muito dolorida porque a perda da minha filha não foi apenas eu que senti. Meus amigos, parentes sofreram junto comigo. Então, a gente precisa de alguma maneira pensar na questão da saúde mental dos povos indígenas”.

Kretã partilha que tem dificuldade de chorar. Relata sobre processos íntimos que tem vivido nesse processo. Reflete sobre a relação entre as lideranças indígenas e suas famílias, no sentido de que passam mais tempo dedicados à luta do que, em momentos, com o círculo familiar. Partilha que esse lugar de destaque no movimento indígena, o torna parecido com um “personagem”. Entende que o falecimento de sua filha revela um processo de abandono dos professores e falta de acompanhamento psicológico. Relata sobre uma reunião sobre saúde mental, organizada pela ArpinSul, e que foi invadida por hackers. Entende que há uma dimensão de ataques aos indígenas que é, eminentemente, psicológica. Exemplifica que os ataques à casas de reza, por exemplo, são ataques psicológicos. Aponta o quão é difícil que lideranças indígenas possam expressar seus sentimentos. 

Danilo Tupinikim da APIB (Coletivo Tybyra) falou sobre a primeira experiência de homofobia que viveu no território e que a colonização segue impactando os povos indígenas para replicarem as violências contra pessoas LGBTQIA+PN. Ponderou também que os povos indígenas recebem muita pressão sobre a salvaguarda da vida e da natureza, mas poucas pessoas se preocupam com as condições de saúde mental destas pessoas. 

Além do CFP, o encontro contou com representantes da Comissão Intersetorial de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas do Conselho Nacional de Saúde (CNS); do Ministério dos Povos Indígenas; do Projeto Xingu, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp); do Conselho Indigenista Missionário; ARPIN Sul; da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil APIB (APIB), do Coletivo Tybyra; da Secretaria de Saúde Indígena dos Ministério da Saúde (SESAI-MS); da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI); e da Articulação Brasileira de Indígenas Psicólogos/as (ABIPSI).

Uma nova reunião deve ocorrer no próximo mês, durante o “Acampamento Terra Livre” para acertar o calendário de atividades do grupo.

CFP publica Referências Técnicas para atuação da Psicologia com Povos Tradicionais

O debate em torno dos povos e comunidades tradicionais no Brasil é um assunto relativamente novo. Para aprofundar o tema com a categoria, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) apresenta a publicação “Referências Técnicas para atuação de psicólogas(os) com Povos Tradicionais”, produzida no âmbito do Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas (CREPOP).    

O objetivo é que o documento seja um instrumento técnico, ético e político por demarcar os compromissos da Psicologia na garantia de condições de vida dignas a todos os povos que constituem a sociedade brasileira, respeitando sua autonomia, independência e valores, sem ferir, negligenciar ou desconsiderar seus modos de vida e costumes, no respeito a suas crenças e relações com o território.  

Compreendem povos tradicionais os povos ciganos, povos e comunidades de terreiro e de matriz africana, faxinalenses, catadoras de mangaba, quebradeiras de coco-de-babaçu, comunidades pantaneiras, pescadores e pescadoras artesanais, caiçaras, extrativistas, povos pomeranos, retireiros do Araguaia, comunidades de fundo e fecho de pasto, comunidades extrativistas do cerrado, dentre outros.  

A referência foi elaborada por um grupo de especialistas e posteriormente passou por consulta pública para que a categoria contribuísse, tornando o processo mais democrático e participativo.

A publicação será lançada no dia 12/12/19 durante a Reunião Ordinária do Conselho Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais, no qual o CFP tem representação.

A distribuição e lançamento local será realizado nos CRPs.

Leia as Referências Técnicas para atuação de psicólogas(os) com Povos Tradicionais

CNDH publica relatório sobre direitos dos povos e comunidades tradicionais

O Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) publica a íntegra do Relatório sobre os Direitos dos Povos e Comunidades Tradicionais. Intitulado “Povos Livres, Territórios em Luta”, o documento foi aprovado em Plenário durante a 43ª Reunião Ordinária do CNDH, ocorrida nos dias 10 e 11 de dezembro, com a presença de conselheiras e conselheiros dos dois biênios (2016-2018 e 2018-2020).

O relatório aprovado é fruto do trabalho desenvolvido pelo Grupo de Trabalho dos Direitos dos Povos e Comunidades Tradicionais, instituído pelo CNDH com o objetivo de levantar casos de violações de direitos humanos contra povos e comunidades tradicionais. A publicação gerada tem como foco os registros sobre as missões acompanhadas pelo CNDH, com vistas a gerar recomendações para garantia dos direitos dessas populações.

Para o representante do Conselho Federal de Psicologia (CFP) no CNDH, o conselheiro Paulo Maldos, as recomendações do documento visam a superação dessas situações de agressões de direitos.  “O relatório é extremamente importante, pois dá visibilidade a esse conjunto de povos, da existência deles nos territórios, os direitos que eles têm na legislação brasileira e na legislação internacional”.

O conselheiro do CFP ressalta ainda a importância do CNDH como instituição de Estado e não de Governo responsável pelo monitoramento e por cobrar que as recomendações do relatório sejam realizadas tanto para entes do Estado, quanto para as empresas.

Missões

Ao longo de 2018, foram realizadas quatro missões que buscaram a diversidade de locais e de segmentos. A primeira missão ocorreu no município de Santo Antônio do Descoberto (GO), entorno do Distrito Federal, com enfoque na atuação de parteiras, benzedeiras e raizeiras. Em seguida, foi realizada missão com os extrativistas costeiros e marinhos da Reserva Extrativista de Canavieiras (RESEX Canavieiras), em Canavieiras (BA). A terceira missão envolveu as comunidades tradicionais de pantaneiras e pantaneiros em Cáceres (MT) e Corumbá (MS). Por fim, ocorreu a missão com as comunidades tradicionais do norte de Minas Gerais.

Constatadas as violações, o relatório do CNDH propõe recomendações destinadas a instituições responsáveis pela proteção e promoção de direitos humanos, bem como o encaminhamento de representações, de acordo com as prerrogativas constitucionais, as quais reconhecem o conjunto dos povos e comunidades tradicionais como sujeitos de direitos da Convenção 169 da OIT – Organização Internacional do Trabalho e Decreto 6.040/2007, além dos direitos de Povos Indígenas (Artigos 231 e 232 da Constituição Federal) e das Comunidades Quilombolas (Artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal).

Além do Conselho Federal de Psicologia (CFP), compuseram o Grupo de Trabalho Direitos dos Povos e Comunidades Tradicionais do CNDH o Conselho Nacional dos Povos e Comunidades Tradicionais (CNPCT), a Organização pelo Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas (FIAN-Brasil), o Ministério Público Federal (MPF), a Defensoria Pública da União (DPU), a Comissão Pastoral da Terra (CPT), a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), a Associação Brasileira de Antropologia (ABA) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

Confira na íntegra o “Relatório sobre os Direitos dos Povos e Comunidades Tradicionais – Povos Livres, Territórios em Luta”.

Com informações do Ministério dos Direitos Humanos (MDH).

 

 

Rede de Psicólogos planeja articulações com povos tradicionais

Para ajudar a montar uma rede com povos tradicionais, indígenas, quilombolas, de terreiro e em luta por território, membros do Conselho Federal de Psicologia (CFP) Jureuda Guerra, Marisa Helena Alves e Paulo Maldos, participaram, de 7 a 9 de setembro, em Guararema (SP), em conjunto com outras 150 pessoas, do I Encontro da Rede de Articulação: Psicologia e Povos Tradicionais, Indígenas, Quilombolas, de Terreiro e em luta por território (I ERA).

A proposta é criar uma rede de profissionais, pesquisadores, estudantes e militantes que atuam com essas populações de forma a construir outra Psicologia junto aos diferentes povos do continente.

O encontro, segundo o conselheiro Paulo Maldos, permitiu verificar a quantidade de profissionais que já atuam com esses povos e comunidades tradicionais. “E essa participação gerou uma série de questionamentos quanto às práticas e às definições teóricas da Psicologia. As inquietações foram compartilhadas nos encontros preparatórios e esses desafios teóricos e práticos foram levados ao encontro nacional, o que permitiu que os debates fossem muito ricos quanto às novas perspectivas da Psicologia brasileira e latino-americana, baseadas no compromisso junto a esses povos e comunidades”.

Jureuda Guerra destaca que toda a produção da Psicologia em relação a essas populações são produções eurocêntricas, elaboradas a partir de um referencial que acabou subjugando esses povos e a intenção do encontro foi reescrever a história da Psicologia com as populações tradicionais, indígenas, quilombolas, de Terreiro e em luta por território. Segundo ela, “procurando, por meio dos conceitos da interseccionalidade, compreender o racismo ao qual essas populações estão submetidas”.

Subjetividades

Para Marisa Alves, profissionais da Psicologia no diálogo com indígenas e povos tradicionais quilombolas têm muito a contribuir e a aprender com essas populações. Ela considera, no entanto, que a Psicologia “precisa estreitar o diálogo com estas populações e buscar o entendimento das subjetividades construídas nas diferentes culturas”.

A proposta é que o Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas (Crepop) elabore três referências técnicas relacionadas ao tema: sobre Psicologia e povos indígenas, Psicologia e povos quilombolas e Psicologia e povos tradicionais. Os conselheiros do CFP ouviram as demandas construídas pelos participantes do encontro e essas discussões servirão de subsídio para a redação dos documentos do Crepop.

Na plenária final, foram discutidos os temas encaminhados pelos participantes dos debates regionais, que foram analisados, revisados e aprovados.