Prêmio João W. Nery: Conselho Federal de Psicologia inicia período de inscrições

O Conselho Federal de Psicologia (CFP) recebe a partir desta segunda-feira (8) as inscrições de pessoas interessadas em participar do Prêmio João W. Nery: Práticas de Promoção de Cuidado, Respeito e Dignidade das Pessoas Trans.

A iniciativa, lançada no Dia Nacional da Visibilidade Trans, pretende identificar, valorizar e divulgar a atuação de psicólogues(as)(os), coletivos, grupos e organizações que envolvam a Psicologia como prática profissional alinhada aos direitos dessa população.

De acordo com as orientações estabelecidas pelo edital, as(os) proponentes devem apresentar experiências que dialoguem com o tema central do prêmio. É imprescindível que as(os) profissionais estejam em situação cadastral regular e adimplentes junto ao seu respectivo Conselho Regional de Psicologia (CRP).

A submissão dos trabalhos deverá ocorrer exclusivamente pelo formulário eletrônico até o dia 30 de junho em uma das categorias: “Transafirmative”, “Individuais” e “Coletivas”. Além disso, as iniciativas precisam se relacionar a um dos eixos orientadores: Práticas acadêmicas (relatos de pesquisa, ensino ou extensão); Práticas de cuidado (relatos de experiência); ou Práticas artístico-culturais (poesias, vídeos, crônicas e demais manifestações artístico-culturais).

Serão selecionadas, ao todo, nove experiências com premiação no valor de R$ 2.000 (dois mil reais) cada – independentemente da categoria/eixo orientador.

Serviço

Prêmio João W. Nery – “Práticas de Promoção de Cuidado, Respeito e Dignidade das Pessoas Trans”
Inscrições: 8 de maio a 30 de junho de 2023
Exclusivamente on-line
Formulário eletrônico para a submissão dos trabalhos
Acesse a íntegra do edital e retificação.

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Vídeo aprofunda debate sobre Psicologia e a despatologização das identidades trans

O Conselho Federal de Psicologia (CFP) lançou, no último dia 29, o vídeo “A despatologização das transexualidades e travestilidades pelo olhar da Psicologia – Parte II”, que traz um debate aprofundado sobre a atuação da Psicologia em relação à despatologização, abordando a responsabilidade dos (as) psicólogos (as) nos consultórios, ambulatórios, no sistema único de saúde, pesquisas acadêmicas e serviços públicos. A peça audiovisual faz parte de série realizada pela campanha “Despatologização das Identidades Trans e Travestis”.

No formato de entrevista, o vídeo conta com a fala de psicólogos (as) e acadêmicos (as), que falam do papel ético, político e profissional da categoria na luta pela despatologização, trazendo à luz as dificuldades enfrentadas, como a formação precária dos (as) psicólogos (as) em relação às temáticas de diversidade de gênero e sexual, a vinculação à psiquiatria no fornecimento de diagnósticos, problemas das pessoas trans e transexuais no acesso ao sistema de saúde, assim como a importância da valoração da experiência das pessoas que vivem as transformações de todas as formas, frente ao conhecimento científico e profissional.

Para os (as) entrevistados (as), os profissionais da psicologia e estudantes devem assumir seu papel em busca pela despatologização dos diagnósticos no Brasil. Membro da Comissão de Direitos Humanos do CFP, o professor e doutor Marco Aurélio Máximo Prado (UFMG) destaca o caráter patologizante na formação recebida pelos (as) psicólogos (as) nas universidades em relação aos temas da diversidade sexual e de gênero. “A história da psicologia normatiza e patologiza as sexualidades e as transexualidades. Hoje o nosso fazer está completamente regulado pela posição da Psiquiatria, que não é a nossa (posição)… estamos fazendo um trabalho que não é nosso, estamos fazendo um trabalho que a Psiquiatria decidiu sobre as transexualidades como um transtorno mental e transtorno sexual”, lamenta. Para o psicólogo, deve-se desconstruir e  questionar a atual formação e posicionamento da categoria.

O CFP e os entrevistados consideram que despatologizar as identidades significa ampliar os direitos de acesso à saúde e cidadania, e não limitar. “Essa ideia de que é importante ter um diagnóstico, porque isso permite às pessoas ter acesso à saúde, é uma ideia falsa, porque há muitas possibilidades de acesso à saúde que não passam por nenhum diagnóstico de patologia, como a gravidez, por exemplo”, destacou Prado. “Esse argumento de que se precisa da patologização para o acesso ao serviço e é por isso que a gente faz, tem que desconfiar um pouco disso. Qual o papel ético/político do psicólogo no sentido da desconstrução desta patologização? Se o psicólogo é um profissional de saúde mental, ele vai ter um papel preponderante aí nesta desconstrução”, reforçou no vídeo a professora, coordenadora do Laboratório Integrado em Diversidade Sexual e de Gênero, Políticas e Direitos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Anna Paula Uziel.

A parte II do vídeo traz, ainda, um panorama sobre a atuação dos ativistas na luta por direitos igualitários na história da sociedade e, mais especificamente, na luta pela despatologização. Citando os movimentos sociais, como o negro, o feminista e o LGBTTT o vídeo fala das conquistas e avanços já realizados na busca pela igualdade, pela legitimidade das relações, pelo direito à diferença, ao reconhecimento das equivalências sociais, e à visibilidade em vários espaços sociais e na ciência.  Para os (as) entrevistados (as), é essencial que a Psicologia valorize a experiência de quem fala – dos transexuais e dos travestis.  “Os movimentos feministas, os movimentos LGBTs, passaram anos e ainda passam, tentando descolar a sexualidade de reprodução, orientação sexual de identidade de gênero. Quando a gente faz essa junção para falar da necessidade da adequação entre o corpo e o gênero, isso me parece um grande retrocesso”, ressaltou Uziel.

A professora doutora Tatiana Lionço (Universidade de Brasília – UnB) também opina que narrativas psicológicas sobre transexualidade devem ser levadas em consideração pela ciência. “Eu acredito em uma Psicologia que leve em conta, fundamentalmente, as vozes dos sujeitos na construção dos discursos psicológicos sobre esses sujeitos (eles próprios). Nós não podemos retroceder nesse ponto… são as pessoas transexuais que nos ensinam sobre a transexualidade, e não o contrário. Por que o afã tecnicista faz com que muitos profissionais coloquem a voz da pessoa trans em segundo plano, aí eles vão se revestir de todo um arcabouço ‘conceitual’, que muitas vezes faz com que eles não consigam escutar o que a pessoa trans tem a dizer”, destacou.

Campanha

Participam ainda das entrevistas a professora Jaqueline Gomes de Jesus, doutora em Psicologia Social do Trabalho e das Organizações (UnB) e o professor Emerson Fernando Rasera (USP). Dividido em duas partes, o primeiro episódio de “A despatologização das transexualidades e travestilidades pelo olhar da Psicologia” abordou os problemas vividos pelas pessoas trans e travestis e a patologização de suas identidades. Estas peças videográficas terão prosseguimento com os títulos “A luta pela despatologização no mundo”, sobre o avanço da ciência, o histórico e momento atual e a luta e organização de movimentos sociais pela despatologização; e “Visões diversas da despatologização no Brasil”, em que será abordada a realidade brasileira, a visão das pessoas trans e as dificuldades do sistema de saúde brasileiro, além de possíveis alternativas.

As peças audiovisuais fazem parte de campanha em prol da despatologização das identidades transexuais e travestis, iniciada em 2014 pela autarquia, que conta com a realização de debates e um site especializado no tema (despatologizacao.cfp.org.br)

Assista:

Parte I

Parte II

Na semana de luta contra a homofobia, ativistas debateram as violências sofridas pelas pessoas LGBT

ed1 A luta contra todas as formas de sofrimento relacionado à orientação sexual e identidade de gênero foi tema de mesa de conversa promovida pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP) na última sexta (22), em Brasília. O debate, transmitido via Internet, contou com a participação de ativistas dos movimentos sociais, que falaram sobre as violências simbólicas e físicas vividas por lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros e pessoas intersexuais e suas relações com a Psicologia. O evento marcou a semana em que se comemorou o Dia Internacional de Luta Contra a Homofobia, 17 de maio.

Apesar de as homossexualidades terem sido despatologizadas ainda na última década do século XX, estas populações ainda vivem, diariamente, constrangimentos, discriminação e vários tipos de sofrimento. Presente ao debate, Carlos Magno Fonseca, da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), destacou que a sociedade exclui os grupos que fogem à norma da heteronormatividade. “O preconceito é um mecanismo para manter uma sociedade desigual. Estamos em situação de subalternidade dentro desta sociedade.E isso tem o nome de homofobia – ou lesbofobia, gayfobia, pois existem especificidades da manifestação desses preconceitos”, ressaltou.

“A homofobia está institucionalizada quando o Estado não enxerga as pessoas LGBT ed3como uma população que tem de ter direitos e cidadania, quando o Estado não tem ações afirmativas específicas de empoderamento para esta população”, disse. Fonseca comemorou as vitórias do movimento, mas sublinhou a atuação de um setor conservador da sociedade – com grande representação no Congresso Nacional – que pretende excluir a população LGBT. Ele lembrou, ainda, que não existe no país uma lei que criminalize as pessoas que cometem crime contra as pessoas LGBT, e que, a cada 28 horas, um homossexual é brutalmente assassinado no país (dados do Grupo Gay da Bahia).

No caso das transexualidades, a situação ainda é mais complexa, pois ainda são consideradas doenças. “Temos utilizado os mecanismos de luta para a construção da retirada dessas patologias dos códigos de classificação internacional de doenças e buscado refletir, repensar as nossas práticas profissionais (da Psicologia) no direcionamento da despatologização”, declarou a psicóloga e representante da Comissão de Direitos Humanos do CFP, Rebeca Bussinger, que mediou a mesa.

ed_2Para Luciano Palhano, do Instituto Brasileiro de Transmasculinidade (Ibrat), a patologização das identidades transexuais marca a violência institucional e da sociedade perante esta população. “A homofobia se desmembra, e considero que mesmo com esta compreensão é importante marcar o sentido de que pessoas trans também podem sofrer violência dupla, homofóbica e transfóbica, pela questão do estigma. As pessoas trans, inclusive, também podem ser heterossexuais”, explicou. Ele destacou a violência simbólica diária sofrida por esta população nos olhares, gestos, negação de direitos, das identidades e das expressões de gênero. “Essa violência fere e mata, e não pode ser de forma alguma negligenciada. As pessoas trans reorganizam e desordenam a orientação de sexo e gênero, e desorganizar essa lógica é ameaçar a identidade de muitas outras pessoas, mesmo dentro do próprio movimento LGBT, isso faz com que a gente se transforme em alvo de agressão, violência e anulação”, lamenta.

A ativista Andreia Lais Cantelli, da Articulação Nacional das Travestis, Transexuais e Transgêneros do Brasil – ANTRA/PR, concordou ao apontar que a sociedade está historicamente hierarquizada pelo machismo, pela simetria de gênero e sexualidade – homem e mulher – e que existem outras possibilidades de se construir e viver práticas de sexualidade e gênero. Para ela, por não se enquadrar nesses padrões históricos, as pessoas LGBT acabam entrando em processos de exclusão, vulnerabilidade e violência.

Ela lembrou que o processo de estigmatização das pessoas transexuais e travestis se inicia já no ambiente familiar e, depois, no ambiente escolar. “As escolas estão preparadas para receber o homem com pênis e a mulher com a vagina. Este espaço não está preparado para receber as pessoas trans, que não aguentam a pressão e a violência e acabam saindo da escola, acabam sendo expulsas desse ambiente. E a escola vai dizer que a pessoa teve a oportunidade mas que ‘quis ir pra rua’. Na verdade, o processo de transfobia foi tão grande que a pessoa não aguentou a pressão e acabou por sair”, lamenta.

Já Luciano Palhano destacou, também, a violência institucionalizada por parte do Estado, com a ausência de pesquisas e políticas públicas, principalmente na área da saúde. “As pessoas não querem compreender como se configura esse corpo, quais são as especificidades que precisam ser tratadas na hormonização, na cirurgia. As pessoas trans vivem hoje no limbo onde o corpo dela não é visto, não é estudado, não é acessado. Mas o nosso lugar não é o limbo, nosso lugar é a cidadania”.

A Psicologia e o atendimento das pessoas LGBT

ed5O papel da Psicologia e o processo transexualizador foram pontos em comum na fala dos ativistas. Para eles, os (as) profissionais psicólogos (as) devem rever a atuação junto às pessoas LGBT, tomando uma postura de auxílio emocional e psíquico e fugindo de termos e procedimentos que remetem à patologização, seja nos consultórios, na educação, na saúde ou nos serviços públicos em geral. Eles apontaram, ainda, a necessidade da inclusão do debate sobre gênero e sexualidade nos currículos dos cursos de Psicologia no país.

“Os profissionais da Psicologia não podem reproduzir termos como ‘transtorno’ ou ‘disforia’. Cabe aos psicólogos garantir a autonomia, tentar produzir consciência e parar de reforçar esses termos patologizantes como ‘desconforto com o próprio corpo’”, explicou Palhano. Para ele, o (a) psicólogo (a) não deve atribuir todas as formas de sofrimento à experiência trans. “As pessoas trans vão aos consultórios e todos os sofrimentos, toda a angústia são atribuídos à experiência trans. Mas a pessoa se compõe de várias dimensões e são essas dimensões que precisam ser trabalhadas pelo profissional da Psicologia”, observou, sinalizando que os (as) profissionais precisam adotar a postura do CFP, que é do olhar despatologizante das identidades trans.

“A nota técnica do CFP é bem bacana, com olhar despatologizante em relação a outras categorias, mas não é o suficiente enquanto não fizerem com que esse olhar atravesse os profissionais de todo o país”, disse, solicitando que se criem estratégias para que a postura despatologizante chegue às universidades e serviços públicos em geral.

Para Cantelli, é preciso rever o processo transexualizador no país e o papel da Psicologia neste processo – para ela, uma “máquina de fabricação de corpos”. A representante destacou que as exigências e protocolos a serem cumpridos para o acesso ao sistema transexual no Sistema Único de Saúde acarretam outras formas e processos de violência. “Para que as pessoas transexuais entrem neste processo, devem passar por uma equipe multidisciplinar e ter seus comportamentos enquadrados dentro da norma heteronormativa. Se a pessoa trans possui ‘desvios’ que não correspondem à norma simétrica de gênero, esta pessoa não estará apta a continuar o processo transexualizador, que ainda dá ideia de começo e fim. No final, ela pode ser avaliada como transexual ou não, de acordo com os protocolos da equipe multidisciplinar”, lamenta. Para ela, o prazo para começar e terminar o processo transexualizador parece significar que, no final, a pessoa estaria “curada”.

Ela disse, ainda, que o processo transexualizador está preparado para receber apenas as pessoas que estejam dispostas a realizar uma cirurgia de mudança de sexo e que outros serviços, como acompanhamento hormonal, endocrinologia, acompanhamento médico, de orientação, não estão previstos isoladamente pelo SUS.
“As pessoas travestis e as pessoas trans são diferentes. Podem ter os mesmos anseios e trajetórias, mas não são iguais. Que os protocolos e atendimentos da Psicologia sejam mais flexíveis e não tão duros quanto é o processo transexualizador, que não contempla as diferentes vivências”, aponta.

Segundo Rebeca Bussinger, os profissionais da Psicologia podem assumir variados papeis na luta pela despatologização e contra as violências homofóbicas e transfóbicas. A mudança, para ela, deve passar pela formação profissional e pelo incentivo a pesquisas acadêmicas. “O profissional da Psicologia pode e deve conhecer não só as suas próprias resoluções, mas também de outras profissões, além daquilo que o movimento social tem pautado, inclusive se articular aos movimentos sociais. Temos o dever e o direito de estar nos espaços de luta brasil afora, trabalhando, pautando, reivindicando, enfim, questionando todos esses pontos”.

Site Despatologização das Identidades Trans e Travestis

O CFP lançou, também no dia 22, o site especial sobre a Despatologização das Identidades Trans e Travestis, projeto integrante da campanha iniciada em 2014, e que contará com vídeos, links para legislação relacionada (nacional e internacional), área com indicações de blogs/sites de trans que contam suas experiências de vida e transformações, entidades, associações, empresas, fundações amigas da questão da despatologização das identidades trans – além de área destinada a exemplos de atuação alternativa de psicólogos e psicólogas nos ambulatórios e equipes do SUS. Conheça o site aqui.

Assista ao debate: