Assistência psicológica continuada a atletas

O Projeto de Lei nº 7.683/2017, que garante assistência psicológica continuada a atletas, está em consulta pública pela internet. Até o 30 de setembro, interessados em contribuir com o debate podem enviar sugestões ao relator da proposta na Comissão de Esporte do Senado Federal por meio da ferramenta Wikilegis (https://edemocracia.camara.leg.br/wikilegis).

O Conselho Federal de Psicologia (CFP) defende a aprovação da proposta por entender que ela é de grande relevância para a Psicologia esportiva brasileira e para a saúde dos atletas profissionais. De acordo com o diretor Pedro Paulo Bicalho, esse projeto vem suprir lacuna deixada pela Lei 9.615/1998, que até então só mencionava como dever dos clubes em relação à saúde dos atletas a oferta de exames médicos e clínicos.

“A assistência psicológica aos atletas não se refere apenas ao campo tradicional do atendimento psicoterapêutico, mas versa sobre a otimização da performance do atleta por meio de treinamentos de habilidades psicológicas que são imprescindíveis ao esporte: concentração, foco, atenção, memória, controle da ansiedade, gerenciamento de estresse e motivação”, explicou o diretor do CFP, durante audiência pública na Comissão de Esporte do Senado Federal, em agosto.

Há 15 anos atuando como psicóloga esportiva, Andreia Cardoso comprova no dia a dia como o acompanhamento psicológico faz a diferença na carreira dos atletas profissionais. “Não basta estar bem preparado tecnicamente e fisicamente. Existe uma terceira força na base de sustentação de um atleta de alto rendimento que é o preparo emocional para encarar desafios e pressões”, afirma.

Segundo Cardoso, que trabalha na categoria de base de um clube carioca de futebol da série A, o atleta profissional precisa ser resiliente e estar preparado para suportar as pressões que envolvem a prática esportiva. São cobranças que vêm do desejo pessoal de conquistar novos desafios; dos clubes e equipes envolvidas em seu preparo; da torcida e da imprensa. “Ele é o tempo todo cobrado por sua performance. Às vezes, os atletas são vistos como máquina, mas são seres humanos. E o ganho do acompanhamento psicológico é justamente esse: não apenas ajudar no treinamento mental, na otimização da performance, mas nas questões de suporte emocional para todos os desafios que a carreira de atleta exige”, explica Andreia.

Resistência à presença dos psicólogos no esporte

O educador físico Anthoni Santoro aponta outro aspecto importante de os atletas contarem com atenção psicológica: o preparo para a aposentadoria. “Quanto estão na ativa, talvez não percebam a importância desse acompanhamento, mas quando encerram a carreira e ocorre a morte pública (da fama ao ostracismo) eles se desesperam porque não se prepararam para fazer outra coisa além do esporte”, diz.

Na sua experiência de mais de 20 anos como treinador de times de futebol – categorias de base e profissional –, Santoro testemunha os aspectos positivos da presença de um psicólogo na equipe técnica dos clubes esportivos. Ele reconhece que ainda há muita resistência à entrada da Psicologia enquanto suporte emocional para os atletas. “A Psicologia não é vista como prioridade. Há muitos treinadores que não aceitam e os clubes pequenos, por falta de recursos, acabam abrindo mão deste profissional”, comenta.

Mesmo nos grandes clubes, que têm departamento de Psicologia, o serviço ainda se organiza de forma precária, segundo Anthoni Santoro. “Acho ineficaz ainda porque são poucos psicólogos e a demanda é muito grande. Os clubes não pagam um valor condizente com o trabalho dos psicólogos. Também é preciso ter consciência que o trabalho não é a curto prazo. Os psicólogos não são bombeiros que chegam para apagar incêndio. O trabalho é a médio e longo prazo”, resume.

Esporte como instrumento de promoção à saúde

Rodrigo Acioli Moura, da Associação Brasileira de Psicologia do Esporte (Abrapesp), aponta que um equívoco do PL nº 7.683/2017 é estar focado apenas nos atletas profissionais de alto rendimento, especialmente do futebol. “O esporte é uma ferramenta para o desenvolvimento. O indivíduo será um bom atleta se ele estiver bem de saúde. Infelizmente, o esporte de alto rendimento deixou de ser saúde e bem-estar. Muitas lesões e profundo estresse marcam a carreira. Por isso, o trabalho do psicólogo deve ser também de promoção à saúde, de apoio à construção de um ambiente profissional mais saudável”, avalia.

O diretor Pedro Paulo Bicalho explica que a promoção da saúde é a grande preocupação do CFP com o projeto. “A lógica de saúde não pode ser menor que a lógica de mercado. Saúde não é ônus, mas investimento”, afirma. Bicalho ressalta que o objetivo do Conselho Federal de Psicologia ao defender o projeto não é fazer reserva de mercado, mas debater o cuidado com a saúde psicológica dos atletas brasileiros.

CFP lança documento de referência sobre relações raciais para profissionais da Psicologia

Contribuir para superar o racismo, o preconceito e a discriminação é o principal objetivo do Conselho Federal de Psicologia com a publicação “Relações raciais: referências técnicas para a prática da(o) psicóloga(o)”. O documento, produzido pelo Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas (Crepop), tem lançamento previsto, dia 29 de setembro, no 13º Congresso Nacional de Psicologia Escolar e Educacional: pela democratização da educação (Conpe), em Salvador (BA).

O presidente do CFP, Rogerio Giannini, a vice-presidente, Ana Sandra Fernandes, e conselheira-tesoureira, Norma Cosmo, e as conselheiras Clarissa Guedes e Regina Pedroza vão representar a entidade no evento.

A elaboração das referências foi solicitada pela categoria, durante o 9º Congresso Nacional da Psicologia (CNP 2016), no qual diversas propostas indicaram a necessidade de promover o combate ao racismo. A conselheira Clarissa Guedes explica que “o material vai contribuir para qualificar a atuação profissional no que diz respeito à diversidade racial e ao sofrimento psíquico advindo do racismo”.

“Se pensarmos no mito da democracia racial, o caderno vem para desmistificar esse lugar”, explica a conselheira Célia Zenaide. Para ela, é necessário olhar para parcela da população que não é a minoria, mas sim a maior parte da população brasileira deixada à margem da sociedade.

A publicação faz um mapeamento sobre o racismo no Brasil e também dos esforços que empreendidos para sua superação. Ajuda, ainda, na compreensão do cenário, dos mecanismos acionados para reduzir e eliminar direitos humanos e do desmonte de políticas públicas. Na visão do conselheiro Paulo Maldos, da Comissão de Direitos Humanos do CFP, “são ferramentas para construir resistências e caminhos e retomar mecanismos de enfrentamento do racismo”.

A psicóloga Clélia Prestes, da comissão responsável pela redação da referência técnica, enfatiza que pessoas com identidades e características psicológicas diferentes precisam ter um atendimento que considere suas especificidades. Segundo ela, quando se pensa na prática da Psicologia pautada pela raça é possível dar mais qualidade ao atendimento, a partir da equidade. O impacto da publicação é ainda maior para as mulheres negras. “A grande maioria das pessoas que procura a clínica, por exemplo, é formada por mulheres e, nos serviços públicos, por mulheres negras, então, é importante ter a prática com o recorte de raça garantido.”

Para mais informações sobre o 13º Congresso Nacional de Psicologia Escolar e Educacional: pela democratização da educação (Conpe), acesse o site sobre o evento: www.conpe2017.ufba.br.

Aviso de pauta – Coletiva de Imprensa: CFP interpõe agravo de instrumento contra liminar relacionada à Resolução CFP 01/99

O Conselho Federal de Psicologia (CFP) interpôs, na tarde de quinta-feira (21), agravo de instrumento contra a liminar concedida parcialmente, em 15 de setembro, pelo juiz Waldemar Cláudio de Carvalho, da Seção Judiciária do Distrito Federal, contra a Resolução CFP 01/99, atendendo ação popular. A norma orienta os profissionais da área a atuar nas questões relativas à sexualidade. A decisão liminar abre a perigosa possibilidade de uso de terapias de (re)orientação sexual. A ação foi movida por um grupo de psicólogas (os) defensores dessa prática, que representa uma violação dos direitos humanos e não tem qualquer embasamento científico. O recurso foi interposto via Tribunal Regional Federal da 1ª Região.

O presidente do CFP, Rogério Giannini, o conselheiro-secretário, Pedro Paulo Bicalho, e advogados da autarquia vão atender a imprensa para explicar o recurso nesta sexta-feira (22/9), às 11h, na sede da entidade.

 

Coletiva de imprensa
Data: 22 de setembro de 2017 (sexta-feira)
Hora: 11h
Local: Sede do Conselho Federal de Psicologia – SAF Sul (Setor de Administração Federal Sul), Quadra 2, Bloco B, Ed. Via Office, Térreo, Sala 104, Brasília, DF

CFP adere ao Alerta Feminista em favor dos direitos das mulheres

O Conselho Federal de Psicologia assinou, dia 31 de agosto, o “Alerta Feminista” em favor dos direitos das mulheres para a legalização do aborto. O documento, iniciativa da Frente Nacional contra a Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto, foi criado para reforçar a luta do movimento feminista diante do atual cenário político.

“O poder legislativo brasileiro está tomado por uma bancada racista, machista, fundamentalista, violadora-de-direitos, que se fortalece através de ataques sórdidos à autonomia das mulheres”, diz o texto. No tema dos direitos reprodutivos os projetos de lei conservadores impactam negativamente as mulheres, mais intensamente as mulheres negras e dos setores populares, com menos acesso a direitos.

O movimento da Frente Nacional contra a Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto existe desde 2008 e luta pelo direito ao aborto legal para todas as mulheres brasileiras, pelo tratamento do problema do aborto na esfera da saúde pública ao invés da esfera penal, que criminaliza e mata principalmente as mulheres pobres e negras, e deixa todas as mulheres em situação de vulnerabilidade.

Confira o Calendário de Mobilizações:

27 de setembro – 2ª Virada Feminista Online #PrecisamosFalarSobreAborto 24 h – Este ano a Virada começará à meia noite do dia 26 de setembro para terminar à meia noite do dia 27. Vocês poderão assistir tudo ao vivo pelo facebook e, semanalmente, uma circular como esta será emitida a todas as organizações signatárias do Alerta FEMINITA com mais informações. Nos dias 11, 12 e 13 de setembro haverá um Esquenta da Virada Feminista Online às 19h e às 20h, também via facebook.

28 de setembro – Atos públicos em diferentes cidades do país.

O bem viver dos povos indígenas

“O bem viver dos povos indígenas: diálogos, desafios e perspectivas” é o tema do seminário que será realizado, dias 14 e 15 de setembro, na Universidade da Amazônia (Unama), em Belém. O evento busca provocar momentos de diálogo entre os povos indígenas, os trabalhadores de políticas públicas e pesquisadores do tema.

O seminário é realizado pelo Conselho Regional de Psicologia 10ª Região – Pará/Amapá (CRP10), por meio do Grupo de Trabalho Psicologia e Povos Indígenas, pelo Distrito Sanitário Especial Indígena Guamá Tocantins (Dsei Guatoc/Sesai/MS) e pela Universidade da Amazônia (Unama).

As inscrições, gratuitas, podem ser efetuadas por meio do formulário eletrônico disponível em https://goo.gl/forms/cC231w0wa7qc0Pl53.

 


Serviço

Seminário: “O bem viver dos povos indígenas: diálogos, desafios e perspectivas”
Data: 14 e 15 de setembro de 2017
Horário: 9h
Local: Av. Alcindo Cacela,287, Belém, Pará

 

Programação

14 de setembro

9h – Abertura.

10 – Mesa de abertura institucional.

10h40 – Fala de representante indígena.

 

Intervalo

14h – Mesa: “Os efeitos sociais das intervenções do Estado sobre territórios indígenas: Belo Monte, Marco Temporal, CPI da Funai no atual contexto de violação dos direitos indígenas”.

16h – Mesa: “Emergência étnica, associativismo e movimento social indígena”.

 

15 de setembro

9h – Mesa: “O bem viver dos povos indígenas: caminhos para o cuidado integral”.

10h30 – Mesa: “O bem Viver dos Povos Indígenas: indissociabilidade entre saúde e educação intercultural”.

 

Intervalo

14h – Mesa: “O futuro da Psicologia no Conselho Regional de Psicologia 10 (PA- AP)”: plano de trabalho do Grupo Psicologia e Povos Indígenas. Povos Indígenas e Questões de Gênero.

16h – Mesa: “Povos indígenas e questões de gênero”.

Aviso importante

Informamos que, em decorrência de manutenção dos servidores de internet do CFP, alguns serviços on-line, como site, Cadastro Nacional de Psicólogos, Satepsi, Cadastro de Sites e Portal da Transparência, poderão ficar indisponíveis neste sábado (2/9), das 8h às 12h.

Fóruns de Conselhos Federais no CFP

 

31 de agosto foi marcado por duas reuniões na sede do Conselho Federal de Psicologia (CFP), em Brasília: o Fórum dos Conselhos Federais de Profissões Regulamentadas e o Fórum dos Conselhos Federais da Área de Saúde. O CFP foi representado nos encontros pelos conselheiros Pedro Paulo Bicalho e Regina Pedrosa.

Essa foi a primeira vez que o Fórum dos Conselhos Federais de Profissões Regulamentadas se reuniu no CFP. A Lei. 13.444/2017, que dispõe sobre a Identificação Civil Nacional (ICN) e o Projeto de Lei 6889/17, que limita a atuação de Conselhos de Educação Física ao registro profissional dos responsáveis pela empresa, foram alguns dos assuntos discutidos pelo grupo durante a manhã.

À tarde, os membros do Fórum dos Conselhos Federais da Área da Saúde discutiram a reativação da Câmara Técnica de Regulação.

Veja as imagens:

 

Diálogos itinerantes: a hora do Rio Grande do Norte

Reunião entre diretores do Conselho Federal de Psicologia (CFP) e do Conselho Regional de Psicologia do Rio Grande do Norte (CRP-RN) encerrou, em 25 de agosto, o segundo dia de atividades da XV Semana de Psicologia. Visita integra rodada de reuniões com representantes dos regionais para estreitamento do diálogo.

Em 2017, membros da diretoria do CFP já estiveram nos CRPs do Ceará, Paraíba, Alagoas, Pernambuco, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Mato Grosso do Sul e Tocantins. A expectativa é que esses encontros continuarão acontecendo ao longo do ano.

No encontro no Rio Grande do Norte, o CFP foi representado pela vice-presidente, Ana Sandra Fernandes, pelo secretário, Pedro Paulo Bicalho, e pela tesoureira Norma Cosmo. O encontro contou com parte do IV Plenário “Cuidar, Resistir, Transformar” e de servidores CRP-RN, que ressaltaram a importância de alinhamento entre as demandas nacionais e os desafios locais e, principalmente, da aproximação, vinculação e horizontalidade na consolidação da gestão.

A reestruturação do Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas (Crepop), as demandas nacionais, a agenda de eventos, as articulações, a participação nos espaços de representação (como o Conselho Nacional de Direitos Humanos, por exemplo) e a recomposição de parceiras com as entidades da Psicologia e de outras categorias profissionais foram os principais pontos discutidos.

Para a presidente do CRP-RN, Daniela Rodrigues, “a disponibilidade demonstra reconhecimento de que não apenas todas as Psicologias nos interessam, mas que todos os Conselhos Regionais são importantes para a consolidação do Sistema Conselhos”.

29 de Agosto – Dia Nacional da Visibilidade Lésbica

O Brasil comemora em 29 de agosto o Dia Nacional da Visibilidade Lésbica para relembrar as lutas das mulheres que têm seus direitos de cidadania violados diariamente pelo fato de terem uma orientação sexual fora do padrão heteronormativo.

Para marcar a data e demonstrar o apoio da Psicologia à resistência dessas mulheres, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) lança o vídeo “Dia da Visibilidade Lésbica – Psicologia e Arte na defesa dos direitos e contra o preconceito”.

No vídeo, as psicólogas Sandra Sposito (conselheira do CFP) e Bruna Falleiros (conselheira do CRP-SP) falam do papel essencial dos profissionais da Psicologia no combate ao preconceito contra as orientações sexuais e identidades de gênero. “Temos que pesquisar sobre isso, temos que produzir referências, produzir teoricamente e cientificamente e continuar dando visibilidade. Porque quando se precisa tratar da visibilidade é porque essas pessoas permanecem silenciadas e fora do cuidado necessário e as demandas delas não aparecem como deveriam aparecer na sociedade”, explica Faleiros.

Sandra Sposito lembra que a Resolução 01/1999, ao ratificar que as homossexualidades não constituem doença, nem distúrbio, nem perversão, é um marco da Psicologia na defesa dos direitos humanos. “Temos uma grande força de proteção ao preconceito que é a Resolução CFP 01/1999 que impede os profissionais da Psicologia de patologizarem, tratarem e curarem as homossexualidades”.

O vídeo traz ainda depoimentos das atrizes Elisa Lucinda, Éllen Oléria, Gabriela Correa, Luiza Guimarães, Tainá Baldez e Renata Celidonio que formam o elenco do espetáculo L, O Musical, em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil. A peça, dirigia pelo jornalista Sérgio Maggio, que conta histórias de amor entre mulheres lésbicas leva o público a refletir sobre temas muito importantes como lesbofobia e crimes de ódio contra pessoas LGBT.

Nos depoimentos espontâneos, as atrizes falam sobre a importância de abordar esse tema em todos os espaços, incluindo o teatro, para impedir que absurdos como as tentativas de patologiar as homossexulidades se materializem.  “Voltar a classificar a homoafetividade como uma patologia é um retrocesso imenso para a sociedade”, avalia Elisa Lucinda.

Criança Feliz: o Estado volta ao passado

É a ideia de infância que determina as políticas de um governo para essa faixa da população. No Brasil, a opção do governo federal tem sido por uma definição defasada, se considerarmos que, entre 2016 e 2017, os municípios deixaram de receber mais de R$ 471 milhões para políticas públicas da assistência social, área que, a partir da Constituição de 1988, adquiriu caráter de política pública, deixando para trás o viés assistencialista.

Segundo a Confederação Nacional de Municípios (CNM), o corte orçamentário foi de 19% no período. As reduções nas políticas da assistência social são contrastantes com outras ações do governo federal, pois, no mesmo período, o então Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário criou o Programa Primeira Infância (Criança Feliz) no Sistema Único de Assistência Social (Suas), com orçamento de R$ 328 milhões em 2017.

Os municípios, que já enfrentavam dificuldades para manter os atuais programas, em razão da insuficiência de recursos e da falta de reajustes anuais dos pisos de cofinanciamento, ficaram, então, com os orçamentos mais comprometidos.

“Esse corte de recursos e a proposta do Programa Criança Feliz são muito preocupantes, pois comprometem determinantemente a execução dos princípios, diretrizes e objetivos do SUAS, bem como das garantias estabelecidas no Marco Legal da Primeira Infância (Lei nº 13.257/2016)”, afirma Fabiana Itaci, psicóloga integrante do Conselho Federal de Psicologia (CFP).

Retirada de recursos da rede de assistência social

De acordo com as informações do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) o Programa Criança Feliz repassa recursos e apoio técnico às prefeituras a 2.547 municípios para desenvolvimento de ações de proteção à primeira infância. Até agora, segundo o MDS, R$ 93,4 milhões foram repassados aos municípios para acompanhar crianças beneficiárias do Bolsa Família e do Benefício de Prestação Continuada (BPC). O ponto central do programa é a visita domiciliar de técnicos para mostrar às famílias a maneira correta de estimular o desenvolvimento dos filhos nos primeiros mil dias de vida.

O problema de gestão da política, como aponta o psicólogo Joari Carvalho, que atua em Suzano (SP), é que as prefeituras já desenvolvem ações socioassistenciais e, em busca de mais recursos, em período de orçamentos reduzidos ou congelados, acabam aderindo ao Criança Feliz sem analisar o que terão de investir ou reordenar dos serviços atuais para que o programa funcione e cumpra suas finalidades. Aí reside o problema, pois as equipes municipais já estão comprometidas com ações previstas para os serviços atuais da assistência social, que poderiam ser aprimorados e cobrir adequadamente o atendimento a crianças no período da primeira infância, conforme a lei que regulamenta a Política Nacional da Primeira Infância (Lei nº 13.257/2016). “Bastariam reforço de recursos e apoio técnico das esferas estaduais e federal”, afirma Joari.

Recursos municipais que deveriam ser utilizados em políticas, programas e ações de assistência social estão sendo aparentemente desviados para o cofinanciamento do Criança Feliz. Joari explica: “É um desvio da finalidade da Política de Estado para uma ação pontual de um governo”. Em vez de investir na estruturação do acompanhamento e no atendimento nos Centros de Referência de Assistência Social (Cras), criou-se um programa paralelo, que concorre com ações sociassistenciais ou as sobrecarrega. Apesar de ter objetivos e procedimentos diferentes, o Criança Feliz atribui a gestão dos acompanhamentos às equipes do Cras, em particular à coordenação.

Direitos civis ameaçados pelo Criança Feliz

Na opinião da psicanalista Ilana Katz, a luta pelos direitos civis sempre perde quando se tenta hierarquizar e decidir qual direito é prioritário ou fundamental. “Direitos não se negociam. Nenhum, e para ninguém”, afirma Katz, que enxerga proposição assistencialista nos discursos do governo sobre o programa. Na apresentação do Criança Feliz no portal do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) há referências à inibição do comportamento agressivo e violento na adolescência, ao acompanhamento para famílias beneficiadas pelo Bolsa Família com bebês ou crianças até 3 anos, por meio de assistentes sociais que vão orientar “como criar as crianças em melhores condições”.

Katz vê semelhanças entre os pressupostos do Criança Feliz e os conceitos de infância anteriores à Constituição de 1988. Ela volta no tempo e lembra a história recente do Brasil. Em 1927, a criação do Código de Menores Mello Mattos se baseava em doutrina que afirmava ser dever do Estado assistir os menores abandonados ou de famílias consideradas inaptas ao cuidado do filho. Essa categoria era aplicada às famílias pobres, negras e excluídas dos direitos de cidadania. O saneamento social era a proposta desse código do início da República, que atribuía à infância dos pobres o sentido de periculosidade, como escreveu a pesquisadora Isadora Simões Souza em “Determinantes da institucionalização de crianças e adolescentes em tempos de doutrinação da proteção integral”, sua dissertação de mestrado na Universidade Nova de Lisboa, em 2017.

Em 1979, o Brasil viu segundo Código de Menores nascer. Apesar de alterar o primeiro, manteve as bases jurídicas do documento de 1927. Somente em 1988, a Constituição Federal modificou a compreensão do conceito de infância e da responsabilidade que o Estado tem em relação aos brasileiros dessa faixa etária. Dois anos depois, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) propôs tomá-los como sujeitos de direitos e cidadãos plenos. A categoria “menor” foi abandonada nessa época, e também a doutrina de “situação irregular”, substituída pela de “proteção integral”.

Incapacitação pela pobreza

O programa Criança Feliz propõe acesso a políticas públicas para a infância como norteador da intervenção do visitador domiciliar encarregado do cuidado. Nesse sentido, a psicanalista Ilana Katz avalia que a condição de cidadania da infância estaria sendo respeitada. No entanto, além das políticas públicas para a infância estarem sofrendo impactos do desinvestimento do Estado, a proposição central da tutela presente no discurso sobre o Criança Feliz representa um retrocesso.

Como explica Katz, a dimensão assistencialista do programa do governo federal – ensinar os pais das famílias pobres a zelarem por seus filhos – sustenta a hipótese da “incapacitação pela pobreza” e retira da criança e do adolescente sua condição de sujeito de direitos. Na visão de Ilana, essa abordagem de “um agente do Estado se propor a dar dicas para os pais das famílias pobres sobre como cuidar da criança para que ela não se transforme num adolescente violento” fere os princípios da proteção integral e reassume caráter tutelar da política para a infância.

Joari Carvalho concorda que um dos principais problemas de concepção do programa é a focalização, que beira o discriminatório, em grupos muito específicos – apenas famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família (PBF) e do Benefício de Prestação Continuada (BPC) com gestantes ou crianças. “Parece que o Criança Feliz parte do pressuposto de que basta dizer para a família o que tem que ser feito para garantir magicamente o pleno desenvolvimento da criança”, afirma.

Para a formulação de políticas públicas destinadas à infância, na opinião de Joari Carvalho, é necessário pensar as questões culturais, a relação das pessoas com o ambiente, os papéis de pais e mães, a violência nos grandes centros urbanos e, sobretudo, a falta de acesso às políticas sociais básicas a que as pessoas teriam direito, mas o próprio Estado não garante. “Não se discutiu nada disso, somente se mamães e papais estão cuidando da água, se passam repelente na criança. Pode até ter alguma pertinência, mas é uma simplificação grosseira diante da qual não podemos calar. Se a criança não se desenvolve direito, como eles preconizam, a culpa é da família? No meu entendimento, e de outros atores sociais, o desenvolvimento da criança deve ser pensado como resultado de um conjunto de responsabilidades a serem cumpridas também pela sociedade e pelo Estado, e não só das famílias, que acabam sendo culpabilizadas e ficam sem condições de se defender de mais uma violência contra quem já é vítima de inúmeras omissões do poder público”, avalia o psicólogo.

Controle social ignorado

Joari Carvalho ressalta também que não houve o devido diálogo com a sociedade para a criação do Programa Criança Feliz. “O debate ficou restrito aos formuladores.” Segundo Carvalho, muitos setores da sociedade civil foram ignorados ou pouco ouvidos na implantação súbita e verticalizada do Criança Feliz por questionarem o sentido ético e político da promoção, por parte da União, estados e municípios, de práticas inadequadas e praticamente fiscalizadoras do cuidado das famílias com suas crianças.

Exemplo de instituição que se posicionou contrária ao programa foi o Conselho Municipal de Assistência Social de São Paulo (Comas/SP). Em decisão publicada no Diário Oficial de São Paulo no dia 24 de fevereiro, o Comas deliberou pela não adesão de São Paulo ao programa alegando que o governo federal não havia fornecido informações suficientes em relação às questões técnicas operacionais, metodológicas e conceituais da iniciativa encabeçada pela primeira dama Marcela Temer. O Comas/SP também questionou a origem dos recursos federais e considerou que a falta dessa informação poderia “onerar ações continuadas da Política Municipal de Assistência Social existentes”.

Apesar da orientação contrária, a Prefeitura de São Paulo manteve a defesa da implantação do programa, insinuando que não precisava da aprovação pelo Comas/SP. Em agosto, conseguiu a aprovação do Criança Feliz, em processo que implicou alterações de composição do conselho, radicalização dos debates e polarização das opiniões.

O Conselho Federal de Psicologia (CFP) apoia as entidades (coletivos de usuárias/os e trabalhadoras/es; conselhos municipais e estaduais) que se posicionam criticamente em relação ao Programa Criança Feliz e ao desrespeito ao controle social das políticas de Assistência Social.